domingo, 31 de janeiro de 2021

Descartes, a mulher de Cesar, janelas, STF e a (im)parcialidade de Moro.

 



 

Vou basear-me no pensamento do filósofo Francês René Descartes.  Vou pegar emprestado o ceticismo metodológico dele no intuito de aclarar este texto.

 

Imaginemos que estamos presos dentro de uma casa totalmente vedada.

 

Nesta situação de absoluto isolamento, o que poderíamos ter aprendido com o ambiente externo se tivéssemos nascido dentro desta casa hermeticamente fechada, isolada? Provavelmente não sobreviveríamos, pois não poderíamos aprender nada. No máximo, aprenderíamos a nos esgueirar pelos cômodos vazios com suas paredes lisas e descoloridas.

 

Seria tão bom abrir as janelas!

 

Caso algum ser de fora abrisse as janelas, tudo seria diferente! Apesar de continuarmos presos nesta casa, aprenderíamos muitas coisas através das aberturas luminares. Entretanto, provavelmente esqueceríamos de nos perguntar se as janelas trazem fidedignamente a realidade do lado de fora. Afinal, os vidros podem ser turvos, embaçados ou coloridos. Não há como ver de fora o que está acontecendo nas aberturas da casa.

 

E se estas janelas forem telas de alta tecnologia passando imagens falsas? Como saber?

 

Descartes imagina que nossa mente está presa dentro de nosso corpo. E nossas janelas (retomando a alusão à casa) são nossos olhos, ouvidos, nosso tato e nosso olfato. Nossa alma cria seu mundo interno com as informações que vem daí. Descartes pergunta: os cinco sentidos são realmente confiáveis? Trazem a verdade para dentro do nosso corpo informando adequadamente nossa mente?

 

Percebamos que os sentidos são os provedores biológicos que alimentam nosso hardware e  software (nosso cérebro e nossa mente). Por não percebermos este fato, confiamos cegamente nos provedores.

 

Coisa de filósofo maluco, não? Nem tanto! Vamos atualizar para ampliar o que refletimos até aqui.

 

 

Minha rotina diária se resume a meu bairro e a alguns trajetos na minha cidade. Converso geralmente com as mesmas pessoas. Minha segunda feira é similar a sexta feira. Algumas coisas mudam, mas a rotina dificilmente é quebrada. Imagino que a maioria das pessoas são assim. 

 

Pois bem, nossa rotina é nossa casa fechada. Então, alguém abre nossas janelas para o mundo. Quais são elas?

 

São tantas que, por não podermos olhar todas, escolhemos algumas para acreditar. As janelas para fora da nossa rotina podem ser nossos canais de televisão e do YouTube preferidos, nossos amigos do Face Book e twitter. Escolhemos, mas somos escolhidos também!  Somos desejados pelos robôs, pelas publicidades e programas grotescos, porém, engraçados. É como se as janelas da casa brigassem pela nossa atenção. Querem que vejamos a vida por elas e nelas nos pautemos.  

 

A aparência do mundo dos fatos nos é apresentada. A aparência é muito importante. É ela que dá credibilidade à janela escolhida.

 


             E falando em aparência e em credibilidade...

 

 

Já dizia Júlio Cesar: Á mulher de César não basta ser honesta, deve parecer honesta. Percebem a sutileza? De nada adianta ser honesta sem parecer ser! As janelas só nos dão acesso ao “parecer”! 

 

 

Se Pedro é honesto, mas sua imagem sugere (aquela que passa pelas nossas janelas) desonestidade? Pedro vai se f*! Vai ser desonesto e pronto. Não há o que fazer. E como não questionamos as janelas com suas nuanças, ficamos presos às imagens e vivemos com elas. 

 

Mas só vivemos de imagens! Lembram? Posso provar.

 

Como ir à Brasília acompanhar as sessões do STF se tenho que ir trabalhar amanhã? E se estou em Brasília, como acompanhar uma decisão no TRF 4? Impossível! Caberá às instituições saberem se portar frente as janelas por onde todos as veem! Deverão serem claras aos olhares. Deverão ser confiáveis e aparentar ser de maneira indissociável!

 

Conclui-se: à justiça brasileira não basta ser justa, tem que parecer ser justa. Ser e parecer ser num abraço fraterno inseparável. Mais que no caso da esposa de Cesar.

 

A única maneira de as janelas mostrarem fidedignamente o que de fato acontece nos bastidores da justiça, é ela escancarar seus procedimentos, seus meandros. Isto de maneira que as sombras ou as interpretações sejam mínimas. As pessoas precisam, mesmo encarceradas nas suas rotinas, entender facilmente o que acontece. E este entendimento consolidará a confiança na probidade do judiciário. Ou seja, também é função do judiciário se apresentar luminarmente ao seu público. Apresentar-se antes que alguma janela capture o sentido, reinterprete e faça as pessoas descrerem na instituição.

 

São poucas as pessoas que desconfiam de quem produz as informações. Raros desconfiam das janelas que iluminam suas almas. A maioria se alimenta mentalmente do que se apresenta imediatamente à alma.

 

Caso o judiciário não seja claro evitando decisões contraditórias ou esdrúxulas, nada palatáveis, as pessoas vão desacredita na sua probidade. A instituição cederá espaço para a imaginação e para a interpretação das mídias.

 

Na penumbra a mulher de Cesar até poderá ser honesta, mas parecerá não ser. 

 

As mídias vão se encarregar de preencher as sombras com suas luzes coloridas. Se o judiciário interpreta a lei obscuramente, as mídias vão interpretar o judiciário com a mesma liberdade.

 

Logo o STF terá que se pronunciar sobre a (im)parcialidade de moro. O STF não há que inventar coisas. Nem interpretar de forma obscura. Terá que observar claramente as provas e claramente apresentar a conclusão para as janelas que estarão escancaradas. 

 

Há uma nação inteira a espera de ver o que vai acontecer.

 

Ministros do STF, lembrem. As pessoas só sabem o que lhes chega à mente pelas janelas das mídias. As janelas podem (e tentarão)  deturpar a visão das paisagens externas.

 

Ministros, lembrem também de Cesar. Sejam probos e pareçam ser probos. Simples assim.

 


 

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