Em tempos remotos, vivíamos em cavernas. Nossos problemas
eram limitados: alimentação e segurança. Nossas preocupações giravam em torno
do local onde vivíamos e caçávamos. Com o tempo, os espaços da ação humana cresceram
junto com a necessidade de mais alimentação. Podemos imaginar os grupos
crescendo em número e em necessidades. Podemos igualmente ver pelos olhos da
imaginação as populações de humanos crescendo, o surgimento das nações, do
comércio, das navegações e das tecnologias. Até o ponto em que os humanos
passaram a dominar todo planeta. O que era inimaginável para os moradores das
cavernas, a modernidade conseguiu: o mundo se tornou um lugar pequeno,
conhecível e por todos habitável. Descobriu-se, contra nossa vaidade, que a
terra é pequena, modesta e gira humildemente em torno do sol.
Na mesma proporção em que dominávamos o planeta, crescia exponencialmente
o problema de conseguir dominar a nós mesmos. Somos criaturas inteligentes,
criativas, egoístas e muito problemáticas. Agora o problema é a convivência
comunitária de todos por todo o planeta. Os países não conseguem resolver
sozinhos os dilemas da nossa espécie. Na modernidade éramos cidadãos de nossos
países. Agora somos cidadãos do mundo e no mundo.
A partir do século XIX começam a surgir às organizações
internacionais. As tecnologias da informação permitiram o surgimento dessas
organizações. Podemos afirmar que o que as limita não são as distâncias
físicas, mas as distâncias entre as moralidades e as culturas. O homem ainda é o principal obstáculo para os
problemas criados por ele mesmo.
As organizações internacionais se apresentam como entes
formados por um acordo concluído entre Estados, e são dotadas de personalidade
jurídica própria. [1]
Elas podem, em tese, circular pelos países mesmo quando em guerra. Há acordos
internacionais que garantem a atuação e a segurança das pessoas a elas
associadas. Notadamente no século XX
elas crescem. Não por benevolência dos governos, mas por necessidades globais
reais e urgentes. Em contrapartida, o direito internacional passou a considerar
estas organizações como pessoas jurídicas que possuem direitos e deveres,
podendo apresentar reclamações nas cortes internacionais. Protegidas, podem
agir de forma mais independente. Elas possuem como característica a associação
voluntária de seus membros e, sendo autônomas, o poder se autogerirem. Como
exemplo, podemos citar as que mais se destacam hoje, como a ONU, a OMC, a Otan,
o FMI, o Banco Mundial, a OIT e a OCDE.
Para o exercício de suas atividades no plano internacional,
as organizações internacionais possuem imunidades e privilégios em relação aos
seus bens, pessoal, estabelecimentos e representantes dos Estados que se
encontram acreditados junto ao Organismo Internacional. Essa situação se
explica em razão da necessidade de garantir liberdade e segurança da missão
desenvolvida.[2]
A diplomacia e os países são conclamados a repensar as
relações humanas internacionais como algo presente e real. É fato: os humanos
se relacionam pelo mundo todo. Portanto, mais que estruturas administrativas
que auxiliam pessoas, as organizações internacionais forçam uma política
planetária mais comunitária e solidária.
Entretanto, a força dessas organizações é relativa. Se para
os países economicamente hipossuficientes, elas são importantes; contrário
senso, para as nações poderosas, as organizações internacionais são frágeis e,
não raro, impotentes. O mundo, no seu aspecto político, é um jogo de xadrez.
Vale mais que a força bruta a estratégia e a cooperação. Se uma organização
internacional é frágil como um peão no tabuleiro de Xadrez global, se amparada
por outro peão, no contexto do jogo, essa peça frágil se empoderará muito. Como
exemplo, podemos imaginar uma ação da organização Médico sem fronteiras num
país conflagrado por guerra. Seu poder de ação é ampliado quando amparado pela
ONU ou por vários organismos internacionais.
As organizações internacionais, como já enfatizamos,
desfrutam de limitada ou de escassa autonomia. Se para os países débeis, as
organizações internacionais tendem a representar uma garantia de independência
política e uma forma de buscar o desenvolvimento econômico, para os países
poderosos elas significam, na maioria das vezes, tão somente um terreno
suplementar – o da diplomacia parlamentar- onde atuará o seu poder nacional; as
organizações internacionais são para estes simples apêndices de sua política
externa.[3]
No Brasil atual, após o impeachment da Presidente Dilma Rousseff,
a influência das organizações internacionais decaiu fortemente. Isso evidencia
o despoder delas em determinadas situações, como já foi referido no parágrafo
anterior. Um bom exemplo é a atual situação conflituosa estabelecida entre a
Organização internacional do Trabalho (OIT) e o governo brasileiro (em relação à
“reforma trabalhista”). De forma similar, o desconforto entre nosso governo e o
Mercosul pelo mesmo motivo. Apesar do questionamento internacional em relação à
fragilização dos direitos trabalhistas, não há motivo para acreditarmos que
alguma mudança acontecerá em âmbito nacional. Evidentemente que a conjuntura geopolítica
explica tal fenômeno brasileiro. Cabe novamente a metáfora do jogo de xadrez
global. É preciso, na América latina, o empoderamento entre os “peões internacionais”.
O jornal O ESTADO DE
SÃO PAULO em fevereiro deste ano comentou na página Economia & negócios[4]:
Provocados
por uma denúncia da CUT, um comitê de técnicos nomeados pela Organização
Internacional do Trabalho (OIT), sem poder deliberativo, apresentou duas
críticas à reforma trabalhista do Brasil no Report of the Committee of Experts
on the Application of Conventions and Recommendations, 2018.
1. O Comitê entendeu que a prevalência do
negociado sobre o legislado, consagrada pela Lei 13.467/2017, é contrária ao objetivo de promover
negociações coletivas livres e voluntárias, constante da Convenção 98 da OIT.
Essa crítica demonstra um total desconhecimento da realidade brasileira. A nova
lei reafirmou como inegociáveis 30 direitos garantidos pela Constituição e
abriu a possibilidade de se negociar livremente 15 direitos, determinando que o
negociado seja respeitado pela Justiça do Trabalho. Trata-se, portanto, de uma
inegável valorização da negociação coletiva, como querem a citada Convenção e o
artigo 7.º, XXVI da Constituição Federal do Brasil. (grifo nosso).
O site WWW.O VALOR.COM.BR
escreveu[5]:
O Uruguai demonstrou preocupação com os impactos da reforma
trabalhista do Brasil e pretende pressionar pela organização de uma reunião no
Mercosul que debata o assunto. "Não vamos interferir na legislação interna
dos países, mas queremos marcar preocupações, porque assim vai ser muito
difícil competir", declarou o ministro de Relações Exteriores do Uruguai,
Rodolfo Nin Novoa. "O salário dos trabalhadores não pode ser a variável de
ajuste para a concorrência nos mercados", acrescentou. (...)
No Brasil a informação é dominada por grupos da mídia
tradicional. Por consequência, ocorre por ideologia, a desinformação popular
quanto às forças internacionais que interferem nacionalmente. Não é comum as
pessoas terem consciência que as organizações internacionais podem influenciar
as políticas internas. Geralmente, ou não sabem delas ou as desvalorizam. Por
outro lado, com o revés político que enfrentamos, as mídias alternativas
virtuais vem tratando das repercussões internacionais da prisão do
ex-presidente Lula, da morte da vereadora Marielle e da intervenção militar nos
morros do Rio de Janeiro, entre outros eventos que marcam a anormalidade
institucional em que vivemos. Tenho
especial apreço pelo canal TV 247, mantido no YouTube[6].
Nesse sentido, acredito que é possível que as pessoas passem a entender e a
reconhecer a importância do Direito Internacional Público e, em especial, das
organizações internacionais.
[1]
Guerra, Sidney. Curso de direito internacional público. 9ª edição. São Paulo,
editora Saraiva, 2015. Página56.
[2]
Idem. Página 257
[3]
Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. Manual das organizações internacionais. 6ª
edição. Porto Alegre. Editora Livraria do Advogado, 2016. Página 53
[4] https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,a-oit-e-a-reforma-trabalhista,70002199033 - 22/02/2018. Visitado em 15/08/2018
[6] https://www.youtube.com/channel/UCRuy5PigeeBuecKnwqhM4yg
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