sábado, 25 de agosto de 2018
domingo, 19 de agosto de 2018
A democracia on line e a vontade geral
As mídias são fundamentais desin/informando a população para que esta
possa posicionar-se. A des/informação e democracia fazem uma parceria
indissolúvel na gestão democrática dos países. Garantem a liberdade de expressão
e de opinião. No formato tradicional, geralmente, antes das eleições, os povos
são espectadores, uma espécie de Big Brothers das políticas nacionais. Porém,
com o advento da cibertecnologia informativa, as coisas mudam de aspecto.
Agora, interligados on line, todos tendem a se comunicar com todos o tempo
todo. Todos são textos e contextos ao mesmo tempo. Podemos dizer até que
recebemos informações já as emitindo: emitimos recebendo, recebemos emitindo!
Eu estava lendo Pierre Levy (A inteligência Coletiva) quando essas
reflexões vieram a minha mente. Segundo ele a democracia poderá ser eletrônica.
O que traz inúmeras implicações. Não precisaria haver representatividade formal/física
dos eleitores (os parlamentos por exemplo). A agilidade e a presença ubíqua das
pessoas no ciberespaço, faz com que elas possam cobrar eficácia e ações rápidas
dos entes políticos. Então a representatividade formal off line não conseguiria atender
à essas aspirações on line. Levy sugere o que ele chama de ágora virtual. Através
do acesso universal às novas tecnologias de comunicação e informação, em
especial a Internet, os cidadãos plugados discutiriam em tempo real as questões
da polis. Sem intermediários, os indivíduos se posicionariam e seriam posicionados
pelos outros cibernautas. O acúmulo de informações/decisões tomadas, este
acervo virtual (nas nuvens) criado/utilizado por todos, faria parte do que Levy
chama de Inteligência Coletiva. A conexão cada vez mais densa entre os
indivíduos criaria a inteligência coletiva irmanada à uma democracia
eletrônica. Observem que não quero explicar o pensamento do autor, mas dar
vazão a minha imaginação.
Pincei nessa leitura de Levy elementos que achei interessantes. Gostei
da ideia da participação de todos (pelo menos de todos os plugados) e da participação
política direta (sem representação) na ágora virtual. As pessoas ligadas e
discutindo produziriam boas e significativas mudanças nas sociedades. Lembrei
então do meu amigo Rousseau. Ele também entendia que a vontade do povo não pode
ser representada. Criticou a democracia quantitativa, uma espécie de contadora
de votos. Propôs a vontade geral.
Rousseau entendia que a vontade individual do homem é egoísta. Porém, ao
eliminar todos os interesses conflitantes entre os homens, restaria um
interesse comum, que ele denomina vontade geral. Essa vontade
tende sempre para aquilo que é bom à coletividade. A vontade geral são todos os
interesses, que simultaneamente, são úteis para todos os homens. Não pode ser
confundida com a “vontade de todos”, que seria a somatória de todos os
interesses particulares, egoístas e conflitantes dos homens.
Minha intenção com este escrito é trazer a questão: a vontade geral
(Rousseau) e a ágora virtual (Levy) são compatíveis e produzem sinergia?
Entendo que sim. A percepção atual que
temos das vantagens da eterna e sempre criativa discussão on line no espaço virtual heraclítico, é o elemento que faltava ao
analógico Rousseau. A tecnologia está nos dando a chance de criarmos um novo
jeito de lidar com a política no mundo. Não dá para sabermos (provavelmente
nunca saibamos) onde este caminho nos levará. Mas, o melhor mesmo, é saber que
ainda há caminhos possíveis. Infinitos caminhos (mesmo que tecnológicos) que crescentemente
garantam a crescente qualificação da liberdade e da responsabilidade das nossas
escolhas políticas.
quarta-feira, 15 de agosto de 2018
As organizações internacionais e o Brasil
Em tempos remotos, vivíamos em cavernas. Nossos problemas
eram limitados: alimentação e segurança. Nossas preocupações giravam em torno
do local onde vivíamos e caçávamos. Com o tempo, os espaços da ação humana cresceram
junto com a necessidade de mais alimentação. Podemos imaginar os grupos
crescendo em número e em necessidades. Podemos igualmente ver pelos olhos da
imaginação as populações de humanos crescendo, o surgimento das nações, do
comércio, das navegações e das tecnologias. Até o ponto em que os humanos
passaram a dominar todo planeta. O que era inimaginável para os moradores das
cavernas, a modernidade conseguiu: o mundo se tornou um lugar pequeno,
conhecível e por todos habitável. Descobriu-se, contra nossa vaidade, que a
terra é pequena, modesta e gira humildemente em torno do sol.
Na mesma proporção em que dominávamos o planeta, crescia exponencialmente
o problema de conseguir dominar a nós mesmos. Somos criaturas inteligentes,
criativas, egoístas e muito problemáticas. Agora o problema é a convivência
comunitária de todos por todo o planeta. Os países não conseguem resolver
sozinhos os dilemas da nossa espécie. Na modernidade éramos cidadãos de nossos
países. Agora somos cidadãos do mundo e no mundo.
A partir do século XIX começam a surgir às organizações
internacionais. As tecnologias da informação permitiram o surgimento dessas
organizações. Podemos afirmar que o que as limita não são as distâncias
físicas, mas as distâncias entre as moralidades e as culturas. O homem ainda é o principal obstáculo para os
problemas criados por ele mesmo.
As organizações internacionais se apresentam como entes
formados por um acordo concluído entre Estados, e são dotadas de personalidade
jurídica própria. [1]
Elas podem, em tese, circular pelos países mesmo quando em guerra. Há acordos
internacionais que garantem a atuação e a segurança das pessoas a elas
associadas. Notadamente no século XX
elas crescem. Não por benevolência dos governos, mas por necessidades globais
reais e urgentes. Em contrapartida, o direito internacional passou a considerar
estas organizações como pessoas jurídicas que possuem direitos e deveres,
podendo apresentar reclamações nas cortes internacionais. Protegidas, podem
agir de forma mais independente. Elas possuem como característica a associação
voluntária de seus membros e, sendo autônomas, o poder se autogerirem. Como
exemplo, podemos citar as que mais se destacam hoje, como a ONU, a OMC, a Otan,
o FMI, o Banco Mundial, a OIT e a OCDE.
Para o exercício de suas atividades no plano internacional,
as organizações internacionais possuem imunidades e privilégios em relação aos
seus bens, pessoal, estabelecimentos e representantes dos Estados que se
encontram acreditados junto ao Organismo Internacional. Essa situação se
explica em razão da necessidade de garantir liberdade e segurança da missão
desenvolvida.[2]
A diplomacia e os países são conclamados a repensar as
relações humanas internacionais como algo presente e real. É fato: os humanos
se relacionam pelo mundo todo. Portanto, mais que estruturas administrativas
que auxiliam pessoas, as organizações internacionais forçam uma política
planetária mais comunitária e solidária.
Entretanto, a força dessas organizações é relativa. Se para
os países economicamente hipossuficientes, elas são importantes; contrário
senso, para as nações poderosas, as organizações internacionais são frágeis e,
não raro, impotentes. O mundo, no seu aspecto político, é um jogo de xadrez.
Vale mais que a força bruta a estratégia e a cooperação. Se uma organização
internacional é frágil como um peão no tabuleiro de Xadrez global, se amparada
por outro peão, no contexto do jogo, essa peça frágil se empoderará muito. Como
exemplo, podemos imaginar uma ação da organização Médico sem fronteiras num
país conflagrado por guerra. Seu poder de ação é ampliado quando amparado pela
ONU ou por vários organismos internacionais.
As organizações internacionais, como já enfatizamos,
desfrutam de limitada ou de escassa autonomia. Se para os países débeis, as
organizações internacionais tendem a representar uma garantia de independência
política e uma forma de buscar o desenvolvimento econômico, para os países
poderosos elas significam, na maioria das vezes, tão somente um terreno
suplementar – o da diplomacia parlamentar- onde atuará o seu poder nacional; as
organizações internacionais são para estes simples apêndices de sua política
externa.[3]
No Brasil atual, após o impeachment da Presidente Dilma Rousseff,
a influência das organizações internacionais decaiu fortemente. Isso evidencia
o despoder delas em determinadas situações, como já foi referido no parágrafo
anterior. Um bom exemplo é a atual situação conflituosa estabelecida entre a
Organização internacional do Trabalho (OIT) e o governo brasileiro (em relação à
“reforma trabalhista”). De forma similar, o desconforto entre nosso governo e o
Mercosul pelo mesmo motivo. Apesar do questionamento internacional em relação à
fragilização dos direitos trabalhistas, não há motivo para acreditarmos que
alguma mudança acontecerá em âmbito nacional. Evidentemente que a conjuntura geopolítica
explica tal fenômeno brasileiro. Cabe novamente a metáfora do jogo de xadrez
global. É preciso, na América latina, o empoderamento entre os “peões internacionais”.
O jornal O ESTADO DE
SÃO PAULO em fevereiro deste ano comentou na página Economia & negócios[4]:
Provocados
por uma denúncia da CUT, um comitê de técnicos nomeados pela Organização
Internacional do Trabalho (OIT), sem poder deliberativo, apresentou duas
críticas à reforma trabalhista do Brasil no Report of the Committee of Experts
on the Application of Conventions and Recommendations, 2018.
1. O Comitê entendeu que a prevalência do
negociado sobre o legislado, consagrada pela Lei 13.467/2017, é contrária ao objetivo de promover
negociações coletivas livres e voluntárias, constante da Convenção 98 da OIT.
Essa crítica demonstra um total desconhecimento da realidade brasileira. A nova
lei reafirmou como inegociáveis 30 direitos garantidos pela Constituição e
abriu a possibilidade de se negociar livremente 15 direitos, determinando que o
negociado seja respeitado pela Justiça do Trabalho. Trata-se, portanto, de uma
inegável valorização da negociação coletiva, como querem a citada Convenção e o
artigo 7.º, XXVI da Constituição Federal do Brasil. (grifo nosso).
O site WWW.O VALOR.COM.BR
escreveu[5]:
O Uruguai demonstrou preocupação com os impactos da reforma
trabalhista do Brasil e pretende pressionar pela organização de uma reunião no
Mercosul que debata o assunto. "Não vamos interferir na legislação interna
dos países, mas queremos marcar preocupações, porque assim vai ser muito
difícil competir", declarou o ministro de Relações Exteriores do Uruguai,
Rodolfo Nin Novoa. "O salário dos trabalhadores não pode ser a variável de
ajuste para a concorrência nos mercados", acrescentou. (...)
No Brasil a informação é dominada por grupos da mídia
tradicional. Por consequência, ocorre por ideologia, a desinformação popular
quanto às forças internacionais que interferem nacionalmente. Não é comum as
pessoas terem consciência que as organizações internacionais podem influenciar
as políticas internas. Geralmente, ou não sabem delas ou as desvalorizam. Por
outro lado, com o revés político que enfrentamos, as mídias alternativas
virtuais vem tratando das repercussões internacionais da prisão do
ex-presidente Lula, da morte da vereadora Marielle e da intervenção militar nos
morros do Rio de Janeiro, entre outros eventos que marcam a anormalidade
institucional em que vivemos. Tenho
especial apreço pelo canal TV 247, mantido no YouTube[6].
Nesse sentido, acredito que é possível que as pessoas passem a entender e a
reconhecer a importância do Direito Internacional Público e, em especial, das
organizações internacionais.
[1]
Guerra, Sidney. Curso de direito internacional público. 9ª edição. São Paulo,
editora Saraiva, 2015. Página56.
[2]
Idem. Página 257
[3]
Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. Manual das organizações internacionais. 6ª
edição. Porto Alegre. Editora Livraria do Advogado, 2016. Página 53
[4] https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,a-oit-e-a-reforma-trabalhista,70002199033 - 22/02/2018. Visitado em 15/08/2018
[6] https://www.youtube.com/channel/UCRuy5PigeeBuecKnwqhM4yg
domingo, 12 de agosto de 2018
O resto é o resto. Simples assim.
Imagina fortemente a situação que vou descrever.
Tu estás na rua quando és assaltado por uma fulminante
amnésia. Não sabes mais quem és, nem o que fazes para sobreviver. Muito menos
tua história de vida! Percebes que tuas posses reais são apenas tuas roupas e
pertences pessoais.
O fato é o seguinte: quem tu és moralmente, é exatamente o
que pensas e sentes neste exato momento.
Podes até conjecturar a possibilidade de teres outras
posses ou outras características de personalidade anteriores, mas serão apenas
conjecturas (enquanto durar a amnésia). Se o possuis o carro que está a teu
lado, não tens acesso. Se tens contas em bancos, não tens nem ideia disso. No
teu bolso há apenas trocados. Não tens documentos.
Portanto, és exatamente o que tu portas, pensas e sentes
nesse momento. És totalmente presente. Sem passado, não podes imaginar um
futuro!
Sentes fome. Vais até uma lancheira. Ficas na porta e não
entras. Percebes que és incapaz de entrar sem ter dinheiro para comprar o
lanche. Não podes explicar este sentimento, o porquê, pois não tens história. Olhas
as pessoas inocentes comendo seus lanches de forma distraída. Fácil furtar-lhes
o alimento. Entretanto, uma força interna e inexplicável, misteriosa, impede-te
disso.
Percebes que, de forma automatizada, dás licença para os
mais idosos passarem. Tens o cuidado instintivo de não colidir com os demais
transeuntes e se o faz, pedes desculpas sem refletires. Sorris para uma criança
e sentes pena de um pedinte na rua. Dás a ele teus únicos trocados. Uma moça
derruba um pacote pequeno e tu junta-o do chão e o entrega num ato reflexo. De
onde vêm essas ações reflexas?
Então tu sentas numa praça já cansado. Observas um cidadão
lendo um jornal. As manchetes te trazem desconforto, pois falam de corrupção e
violência. Entretanto, admira a vestimenta do homem que lê. As cores combinam.
Usa gravata. Acha-o uma pessoa chique. Então olhas para ti mesmo. Também estás
vestido de forma elegante. Sapatos impecáveis. Roupas novas. Sentes que
entendes todas as manchetes do jornal, mesmo as mais complexas sobre economia.
Tens opinião pronta sobre tudo o que lês. Percebes que podes opinar com
coerência sobre os temas tratados. Ouve-te mentalmente criticar as mazelas
sociais e a corrupção. Serias, por consequência, uma pessoa estudada e honesta?
Tudo sugere que sim. As coisas que pensas e que sentes são pistas sempre atuais.
Forças a memória para te lembrares da tua identidade. Como
não lembras, percebes uma grande verdade: somos exatamente o que pensamos, sentimos
e portamos nesse momento.
A verdade é filosófica e fatal: tu és aquilo que portas,
sentes e compreendes do mundo no exato momento em que estás agindo/reagindo nele.
O ontem não existe de forma consciente quando estamos em ação. Não importa
títulos ou posses. Mesmo com a memória
apagada, se és um mau caráter, assim continuarás sendo. Se és um obtuso, assim continuarás.
Se fores amoroso, amarás. Se fores odiento, odiarás. Simples assim. A amnésia
não pode disfarçar o que és. Ao contrário, o esquecimento salientará tua essência.
Não importa o que dizes que és. Muito menos os certificados
que afirmam tuas qualidades. Quando tiveres de agir, no segundo exato da
necessidade da ação, agirás conforme tua essência construída no tempo, mas
sempre atualizada. Na ação tua essência será visível. As justificativas são
sempre a posteriori.
A pergunta do sujeito com amnésia se mantém: quem sou? Para
responder, os fatos:
Mesmo com fome, não furtaste. Na rua, procuraste não bater
em ninguém. Foste gentil. Deste passagem aos mais velhos. Pediste desculpas. Sorriste
para crianças. Tiveste pena das pessoas desvalidas e, mesmo com fome, doaste
teus últimos trocados. Devolveste o que não te pertencias. Admiraste uma pessoa
de bom gosto no vestir. Também tuas vestimentas são de bom gosto. Interpretaste
bem as notícias do jornal. Fizeste juízo moral negativo em relação às
imoralidades sociais. São pistas reais, materiais. Pistas evidentes.
Estas são tuas verdades. Não importa outras coisas: só os
fatos. Agora podes saber quem és. Saberás melhor agora do que sabias antes da
amnésia!
Tu és sujeito honesto e gentil. Amoroso com crianças e
idosos. És uma pessoa sensível às desigualdades sociais. Tens bom gosto e és
bem informado. Concluo isso das tuas ações. Não preciso saber tua história de
vida.
Após esse exercício de imaginação, podemos concluir que nós
somos apenas o que possuímos junto a nós, o que sentimos e como agimos. O resto
é o resto. Simples assim.
quarta-feira, 8 de agosto de 2018
Jusfilósofo Pedro
Pedro é um filósofo paupérrimo muito conhecido na cidade.
Ele é um radical seguidor de Antístenes e de Diógenes (aquele que morava em um
barril). Certo dia Pedro sem cerimônias,
furtou um notebook de um cidadão que almoçava em um restaurante ao ar livre.
Todos presenciaram o fato.
Coisa simples: Pedro maltrapilho, alcança o aparelho e sai
com ele tranquilamente. A polícia é chamada. Em minutos, o já conhecido
maltrapilho e filósofo, é levado à delegacia. O delegado, um tanto condescendente,
pois o acusado já é figura folclórica na cidade, pergunta o por quê dele ter feito
aquilo. O delegado avisa que não haverá a comunicação formal do crime, pois a
comunidade já está acostumada com suas maluquices.
Sendo Pedro um despossuído, acredita ser poderoso. Nada tendo a perder, nada é possível contra ele. Então, assume papéis (personas) estranhos que assombram as pessoas. Vive Pedro para assombrar.
Seu novo papel: uma pessoa desejosa de ter coisas e que, portanto, as furta.
Sendo Pedro um despossuído, acredita ser poderoso. Nada tendo a perder, nada é possível contra ele. Então, assume papéis (personas) estranhos que assombram as pessoas. Vive Pedro para assombrar.
Seu novo papel: uma pessoa desejosa de ter coisas e que, portanto, as furta.
Pedro – filósofo cínico e chato – faz sua justificativa:
Ora, afirma o andarilho, o bem jurídico (principal) em
questão é o direito de ter e manter a propriedade privada. As pessoas não podem
ser impedidas de terem coisas, desde que sejam lícitas. Tomar de assalto essas
coisas ou impedir alguém de tê-las ( nesse momento específico ele aumenta um pouco o tom de voz), viola o direito fundamental à propriedade. Não é assim por aqui?
Na verdade, continua Pedro, eu tomei de assalto o objeto daquela pessoa, no intuito de ressaltar a injustiça de impedir alguém de ter coisas (neste caso impedir-me, pois não posso adquirir o objeto) . Ter é direito fundamental. Delegado, eu peguei furtivamente algo para ressaltar que também eu tenho direito de ter coisas. E o Estado tem a obrigação de me proteger, proteger este meu direito! Meu direito de ter não pode ser impedido. Reconheço que errei ao furtar. Foi uma licença filosófica.
Quero fazer uma queixa-crime jusfilosófica! Vamos esquecer meu furto para ver o caso de forma diferente. Veja que quero trabalhar, mas ninguém me contrata. Quero ter dinheiro para poder exercer meu direito constitucional à propriedade, mas ninguém me dá dinheiro. Quero ter as condições para ter coisas. Ora, por consequência lógica, alguém (ou todos nessa cidade) está me impedindo de exercer meu direito fundamental à propriedade. Então, se o Direito Penal me atinge quando eu impeço alguém de manter/ter sua propriedade, quero que de alguma forma, ele proteja meu igual direito de ter coisas! Simples assim: eu não furto se deixarem eu obter licitamente. Se é crime eu pegar coisas, também deve ser crime qualificado o impedimento de eu obtê-las de forma socialmente aceita. Acredito, delegado, que tanto eu quanto minha vítima não questionam o nosso direito fundamental de ter propriedade, nem que é absurdo alguém ser impedido de obtê-las de forma legal.
Na verdade, continua Pedro, eu tomei de assalto o objeto daquela pessoa, no intuito de ressaltar a injustiça de impedir alguém de ter coisas (neste caso impedir-me, pois não posso adquirir o objeto) . Ter é direito fundamental. Delegado, eu peguei furtivamente algo para ressaltar que também eu tenho direito de ter coisas. E o Estado tem a obrigação de me proteger, proteger este meu direito! Meu direito de ter não pode ser impedido. Reconheço que errei ao furtar. Foi uma licença filosófica.
Quero fazer uma queixa-crime jusfilosófica! Vamos esquecer meu furto para ver o caso de forma diferente. Veja que quero trabalhar, mas ninguém me contrata. Quero ter dinheiro para poder exercer meu direito constitucional à propriedade, mas ninguém me dá dinheiro. Quero ter as condições para ter coisas. Ora, por consequência lógica, alguém (ou todos nessa cidade) está me impedindo de exercer meu direito fundamental à propriedade. Então, se o Direito Penal me atinge quando eu impeço alguém de manter/ter sua propriedade, quero que de alguma forma, ele proteja meu igual direito de ter coisas! Simples assim: eu não furto se deixarem eu obter licitamente. Se é crime eu pegar coisas, também deve ser crime qualificado o impedimento de eu obtê-las de forma socialmente aceita. Acredito, delegado, que tanto eu quanto minha vítima não questionam o nosso direito fundamental de ter propriedade, nem que é absurdo alguém ser impedido de obtê-las de forma legal.
O jusfilósofo cínico termina perguntando ao delegado: Posso
fazer agora meu jusboletim de ocorrência?
segunda-feira, 6 de agosto de 2018
A importância do responsável durante o processo disciplinar nas escolas
Prof. Amilcar Bernardi
No aspecto jurídico, todos têm direito a ampla defesa. Todo
o acusado pode/deve refutar os argumentos injustos do seu acusador. Ninguém é
obrigado a calar quando é imputado a si uma infração ou crime. Uma acusação é feita de argumentos, por
consequência, o acusado irá contra-argumentar.
Contra-argumentará com paridade de armas. Esta paridade
refere-se ao imperioso respeito ao princípio da isonomia. Ora, fácil perceber
que, portanto, ao responsável pelo julgamento cabe a imposição
ético-moral-legal de garantir a igualdade entre os que disputam um direito (ou
que se defendem de uma acusação) e de garantir a isonomia entre o poder de
defender-se do réu/acusado e o poder de imposição de pena do Estado. Na
desigualdade não há justiça possível. Duas necessidades imperiosas são aqui
elencadas: o direito à defesa e à paridade. Fica claro na redação da
Constituição Federal, no seu artigo 5º, inciso LV:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: LV - aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
(grifos nossos).
Lembrando que o Código de processo civil se liga a
Constituição Federal ao orientar no seu artigo 1º:
Art. 1o
O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores
e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa
do Brasil observando-se as disposições deste Código.
Os princípios da isonomia e da obrigatoriedade da ampla
defesa, sendo eles constitucionais, são pedra fundamental também nos processos
administrativos. Não é possível dizer que um processo justo aconteceu sem que
estivesse ancorado nos princípios citados acima. Neste sentido, não há mais
controvérsia possível.
No que se refere ao ambiente escolar, o Estatuto da Criança
e do Adolescente faz a seguinte admoestação no seu artigo 3º:
Art 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana,
sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes,
por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de
lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em
condições de liberdade e de dignidade. (grifo nosso).
É possível fazer uma analogia entre os procedimentos
escolares punitivos, que visam apurar o(s) ato(s) indisciplinado(s) do aluno, a
um processo administrativo. Isso por que o adolescente estará frente a
autoridade escolar (Diretor, supervisor ou professor), sendo questionado
(inquisitorialmente) sobre suas ações ou omissões no ambiente escolar.
Percebamos que as declarações deste adolescente são fundamentais para a formação
da convicção desta autoridade. É esta convicção que vai culminar com a
determinação de sanções. A partir da fala deste aluno, como consequência, poderá
ser advertido, suspenso e até expulso. Portanto, convém lembrar o já citado
Estatuto da Criança e do Adolescente, quando garante ao inimputável:
II - igualdade na relação processual,
podendo confrontar-se com vítimas e testemunhas e produzir todas as provas
necessárias à sua defesa;
VI - direito de solicitar a presença de seus
pais ou responsável em qualquer fase do procedimento. (grifo nosso)
A presença dos pais ou responsáveis durante o processo administrativo é
obrigatória por motivos evidentes. São
eles que podem aferir a aplicação com justeza dos direitos processuais do
adolescente, e também a aplicação plena do Estatuto no seu artigo 53, ou seja,
se a criança ou o adolescente está sento tratado com respeito (parágrafo II)
durante os procedimentos inquisitórios. Por esse viés, o artigo 111 do ECA
garante nas questões processuais envolvendo adolescentes:
Art.
111. São asseguradas ao adolescente, entre outras, as seguintes
garantias:
VI
- direito de solicitar a presença de seus pais ou
responsável em qualquer fase do procedimento.
Outro elemento importante para se
observar é o regimento escolar. É nele que está estabelecido o que é a
disciplina, os objetivos da escola, a organização didática e pedagógica da
instituição escolar. E mais, o regimento escolar ao definir a organização
administrativa do estabelecimento de ensino, estabelecerá por consequência, as
competências (e seus limites) de quem ouvirá o aluno no processo administrativo
escolar. Por isso é extremamente
importante conhecer este documento. Só assim os adultos envolvidos perceberão
se a condução processual está dentro do previsto institucionalmente. Não menos
importante, é perceber se o objetivo pedagógico estabelecido pela
escola, vai se materializar na sanção e nos procedimentos processuais. Não é possível sanções
diferentes dos objetivos previstos no regimento! Por exemplo: se o regimento
prevê sanções que eduquem,
excluir-se-á por consequência lógica, aquelas que apenas causem prejuízo sem aprendizagem alguma.
Cabe
salientar que legalmente o adolescente não tem condições para fazer estas
avaliações. Cabe aos pais (ou responsáveis) ler o regimento e cobrar sua aplicação
(inclusive através do judiciário).
Pelo exposto, fica clara a necessidade
do acompanhamento do aluno por seu responsável, sempre que houver um
procedimento administrativo/escolar que poderá ter como resultado uma sanção
importante. A presença (representação
quando menor de 16 anos e assistência
quando maior de 16 anos e menores de 18 anos) dos pais ou responsáveis é
evidente como ratifica o Código de Processo Penal:
Art.
71. O incapaz será representado ou assistido por seus pais,
por tutor ou por curador, na forma da lei.
Nesse sentido é importante lembrar os artigos
3º e 4º do CC:
Art.
3o São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os
atos da vida civil os menores de 16 anos
Art.
4o São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de
os exercer:
I - os
maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
Entende-se,
portanto, que cabe ao adulto perceber se o adolescente está sendo tratado com
igualdade em relação aos demais adolescentes e adultos durante os procedimentos.
Cabe ao responsável equalizar a desigualdade natural entre o adolescente
(aluno) e o adulto (empoderado gestor do litígio escolar). A pessoa adulta é
que deverá avaliar e garantir o direito do adolescente à isonomia, à ampla
defesa e ao contraditório. É preciso ter especial preocupação quando os
argumentos não ocorrerem entre os adolescentes envolvidos, e sim, entre a fala
do adolescente (débil nessa relação) e a fala do adulto (professor ou
funcionário do estabelecimento de ensino). Isso por que o que mais importa é a
fala institucional. Pois é ela que vai aplicar a sanção.
Concluo que a presença dos pais ou
responsáveis nos procedimentos disciplinares nas escolas, é imprescindível. A
instituição que se descuidar estará seriamente sujeita, não só a cometer
injustiça nas suas decisões internas, mas a ser responsabilizada por grave desrespeito
aos direitos dos adolescentes.
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