quarta-feira, 19 de agosto de 2020

A mão invisível do mercado, a matemática e o corpo escondido sob os guarda-sóis.



     
      Para começar apresento a mão invisível do mercado, de Adam Smith (1723 – 1790). Esta mão invisível seria, na ausência da regulação estatal, uma lei: a lei da oferta e da procura. Esta regularia as relações comerciais. Acima das pessoas, disse este economista, está a oferta (que baixa os preços) e a procura (que aumenta os preços ao provocar a escassez dos produtos desejados). Na ausência das regras ditadas pelos governos, a lei “natural” das relações de comércio regulariam friamente os homens e as mulheres em seu consumo de produtos. Assim como a matemática, apesar das paixões humanas, a mão invisível tudo regula.
     
      E já que falamos em matemática, podemos dizer que esta ciência quer sistematizar as quantidades, as medidas e prever suas variações. Baseada em que? No raciocínio lógico que estabelece padrões previsíveis. Esta ciência é humana, criada sob medida pela humanidade. Entretanto, apesar de viver parasitando as mentes das pessoas delas prescinde. Ora, o cálculo é exato apesar dos humanos (que erram muito).  Ou seja, dois mais dois são quatro, mesmo que todos desejem ardentemente que seja cinco. Apesar dos hospedeiros humanos, o parasita matemática zomba deles e age como se tivesse vida autônoma. Que ilusão ilógica dos números. Sem pessoas, sem matemática!
     
      De maneira similar, Adam Smith ao trazer à luz das ciências econômicas a sua mão invisível, criou mais um parasita. Ou seja, assim como a matemática, apesar desta mão ser sustentada por humanos e viver deles, é autônoma e rege seus hospedeiros. Eis dois parasitas esnobes: a matemática e a mão invisível do mercado. Cospem no prato em que comem. O dia em que a humanidade desaparecer, estes parasitas morrem também. Afinal, ambos são criados sob medida pelos e para os humanos.

      Matemáticos e economistas são cientistas que criam parasitas. Desculpem a franqueza.
     
      A prova disto é o funcionário de uma empresa fornecedora de produtos para um supermercado, que morreu em serviço, e foi diligentemente ocultado por guarda-sóis. Ocultou-se a miséria humana para que a matemática das vendas e a mão invisível do mercado continuassem operando. Afinal, humanos atrapalham a coerência e a lógica da matemática e da economia.
     

      Não creio, sendo sincero novamente, que os funcionários e a direção do supermercado tenham de má-fé ocultado o falecido. A culpa é da matemática e mais ainda da mão invisível. Ambos os parasitas infiltrados nos cérebros humanos manipularam as consciências, e fizeram com que procedessem desta forma. Afinal, era a conduta mais lógica. Por que parar as vendas só por que uma pessoa que morreu? Esta não consumiria mais, seria um zero na economia. Mas, as demais pessoas continuariam a consumir. E consumir, sabe-se, é um direito inalienável. Facilitar o consumo sempre é o mais lógico.
     
      Pelo hábito e pela lógica do mercado, é possível entender o procedimento tão inumano. Ora, como já disse, a matemática e a mão invisível não são humanas. São produtos da humanidade, mas não sofrem das incoerências ilógicas das pessoas.  Estes parasitas das mentes são alucinantes. Produzem ilusões estranhas. As pessoas calculam tudo menos os efeitos da banalização de suas próprias vidas. Hoje foi o funcionário escondido para não atrapalhar o comércio. Amanhã será eu ou você.
     
      Os parasitas agradecem nossa ilogicidade.
     

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