sexta-feira, 18 de maio de 2018

A violência na política e a cura pela fala.






Imaginemos uma criança pequena, aquela que ainda fala com dificuldade. Como ela não desenvolveu a habilidade de se comunicar facilmente, é perfeitamente aceitável e previsível explosões de raiva de curta duração. Isso em função das emoções tumultuadas e a dificuldade em expressá-las.



Com o adulto que não se expressa facilmente, não é muito diferente.



Falar de maneira organizada favorece enormemente o escoamento das emoções. A linguagem tem o poder de expressar/escoar necessidades internas, permitindo a fluidez emocional e o consequente esvaziamento das tensões. Por outro lado, a dificuldade de se expressar faz com que as emoções não escoem para fora facilmente. Há, como consequência, o perigo de uma explosão irracional e violenta.



Freud foi notável ao criar a cura pela fala (talking cure). Falar, expressar, coloca as emoções em ordem. Não é possível querer expressar sem antes querer organizar as emoções. Ao comunicar, as energias mentais se põem disponíveis para serem inteligíveis (para o emissor mesmo e para o receptor). Quanta dor, raiva e frustração represam aqueles que não podem (ou não querem) se comunicar. Com frequência a energia acumulada se transforma em movimento físico: um soco, um tapa, um chute. Ou ainda, pode se transformar em palavras caóticas e agressivas. Com essa energia toda, cada palavra é uma pedra arremessada, uma flecha envenenada.  O sofrimento interno explode machucando os que estão em volta. Se a pessoa pudesse expressar o que sente com calma, aos poucos, seria possível diminuir a energia armazenada. A pessoa ao organizar a fala, iria compreender a si mesma e, através do diálogo fraterno, curaria suas dores internas. Ouviria a si mesma e seria ouvida pelos outros.



A possibilidade de se expressar de forma inteligível é um bálsamo para as almas. E quando a expressão se torna impossível? Com certeza a violência poderá acontecer. Pessoas se machucarão. A agressão é a expressão (incompreensível) dos que não sabem, ou não podem se comunicar de forma sadia (fluente).



Na politica essa lógica não é diferente. As ideologias que não podem ser explicadas por seus seguidores, as intenções que não podem ser ditas, mas apenas sentidas e desejadas, tendem à violência. Quem não pode falar e explicar, guarda tensões em si mesmo. Acumula incompreensão e ... explode. Mas por que não fala, não se expõe? Inúmeras vezes a ideologia é revoltante, é excludente e é contra a sociedade fraterna e democrática. Então não pode ser dita, pois é execrável. Quem professa esse tipo de ideologia, tem que guarda-la para si. Tem que defendê-la sem poder explica-la ou justifica-la. Esses ideólogos da exclusão social, do racismo e da meritocracia, não podem se expressar claramente e de maneira sã. É preciso esconder os fundamentos mais profundos das suas crenças políticas. Então, sem falar, assim como as crianças em tenra idade, explodem facilmente em raivas. Mas são adultos. A raiva que é momentânea nos infantes, torna-se uma maneira de viver nos adultos.



Essas pessoas não falam mais. Elas agridem por que não podem comunicar claramente/profundamente o que pensam.  O que pensam é ruim para a sociedade. Então calam e acabam transbordando em raiva e, com a constância dela, em ódio.



A única saída para os ideólogos da exclusão é a cura pela fala verdadeira. Aproximadamente na linha do que Freud propunha. Mas, como se expressariam se o que creem faz mal à sociedade, se é socialmente inexplicável? Falar sobre aquilo que devem esconder é muito doloroso. Sentem como impossível deixar claro para si e para todos, que o que querem é um mundo para as elites. Caso falem, se curariam da violência, mas correriam o risco de mudar suas convicções ideológicas quando postas à luz da razão.



Talvez até não mudassem de ideia. Mas, assumir seus posicionamentos elitistas e excludentes, faria com que aceitassem melhor (internamente) seus papéis deletérios na história do que acontece em nosso país. Quando curadas, ficaria para essas pessoas o dilema: se falarem claramente, quem os seguiriam? Ninguém. Simples assim.




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