terça-feira, 18 de agosto de 2020

O fanatismo e a menina/mãe de dez anos.


 


Tenho o hábito de refletir antes sobre o conceito da palavra chave que vou usar nos artigos. Neste caso, a palavra referência é fanático. O que vem a ser isso? Refere-se a pessoa que se (auto)julga inspirado por algo/alguém superior a todos os demais. Para ser fanatismo, esta crença tem que ser extrema. Não pode ser branda ou razoável. O fanático demonstra excessivo/extremo apreço e entusiasmo por um líder.  E se acha especial por (julgar) ser escolhido por ele. A partir daí, creio ser possível identificar o fanático por suas ações externas a si mesmo, ou seja, suas atitudes.   Por ser uma criatura extremada, fica fácil observar no mundo dos fatos o seu fanatismo.

      Tenho certeza que posso encontrar estas criaturas em situações irracionais, geralmente em grupos, irmanados por slogans desprovidos de realidade e cheio de conceitos feitos antes (preconceitos). Conceitos já fabricados pelo líder, pela seita, pela ideologia, por um mito.  Nestes grupos, cada indivíduo é absorvido pelo outro. De forma que sozinhos são fracos, hilários até, mas em grupo são tenebrosos.  Cada indivíduo é risível sozinho, mas temível em bandos, em hordas.  Estes indivíduos só encontram sentido em suas vidas quando sustentados pelo fanatismo.

      Exemplar é o caso da menina de dez anos estuprada pelo tio de trinta e três anos. Abuso que teve início aos seis anos de idade da criança. O natural das massas seria odiar o agressor e proteger consternadamente a vítima. Agora apresento o exemplo do fanatismo.

 Um grupo religioso agride a vítima criança e esquece o agressor adulto. Chamam a vítima de assassina, pois terá que fazer o aborto legal. Esta palavra - aborto! - desencadeou a fúria fanática. Quase que diziam: “matemos a mãe/menina para salvar a vida do feto. Matar para preservar a vida.”.  Ou ainda: “se morrer a mãe/menina na gestação, aceitamos. Se salvá-la retirando o embrião, que ela viva amaldiçoada.” Certamente estes fanáticos acreditam que o Deus perfeitamente bondoso assim quer.  Todo o fanático acredita falar em nome de alguém: até de Deus!
     
      Estes anencéfalos adultos não veem contradição no que dizem, no que fazem e nas ideias que expõem.  Não possuem mais opinião própria, só a coletiva. São bonecos de ventríloquo do líder sendo aplaudidos apenas por seus iguais. Sob o ponto de vista das ciências da mente, talvez sejam neuróticos.  Eles têm perturbações do psiquismo que provocam desordens no comportamento. Não são doentes do corpo, padecem na alma.  Tem consciência do que fazem, mas se auto justificam em grupo. Um olha para outro e diz: “O mal que estas fazendo é um bem no contexto de um valor maior”.  Por isso, não podem mais viver fora do grupo. São sofredores que provocam a dor alheia na tentativa de mitigar as suas. Cedem a comportamentos rituais e complexos para se afastarem da reflexão sobre seus próprios atos. Se religiosos, oram. Se fanáticos políticos, repetem refrões ideológicos.
     
      Nem as redes sociais, tão cheias de pontos de vista diferentes, podem salvá-los. Estas criaturas tem suas próprias comunidades para se protegerem do que é diferente deles mesmos. Blindam-se contra a diversidade.
     
      O fanatismo revela dificuldade de viver em sociedade. Se acham vítimas (heróis ou heroínas) ou se acham superiores.  Como não são razoáveis, se autoconvencem destas verdades.  Creio que sabem que mentem para si mesmos, então investem em rituais coletivos para esquecerem, para perderem a consciência do mal que produzem.  Por isso, evitam qualquer dúvida. Caso tenham alguma, o líder responderá. Então, por que pensar se são pensados por alguém? Por que pensar por si mesmos se são apenas porta-vozes de um líder??
     
      Estes fanáticos são neuróticos que optaram por viver suas neuroses em conjunto. Sofrem, mas encontram justificativas coletivas para seu sofrer. Sofrem na terra, mas ganharão os céus. Sofrem agora, mas no futuro a política trará um país melhor, um céu na terra. Contam para si mesmos: somos os escolhidos. Gritam slogans para não ouvirem os gritos de dor de quem fazem sofrer.
     
      Não são só os extremistas religiosos que se “neurotizam”. Os seguidores da política extremista também. São fanáticos os que pregam a morte, a dor, a tortura, a ampliação das prisões e a produção de cloroquina. Nem sempre este tipo neurótico é o outro (o “não-eu”). Se tu concordaste com o sofrimento da menina/mãe de dez anos, com certeza precisas de um tratamento psicológico (ou psiquiátrico).
     
     

Quêm lê muito não faz nada. Verdade?