sábado, 29 de novembro de 2025

Educação Antirracista e nossa (re)visão de mundo

 



O ser humano ele não “vê” o mundo. Sempre há uma mediação anterior, pois somos simbólicos. Ver e interpretar são inseparáveis. Quando nascemos, temos contato primeiro com a interpretação que nossos pais e sociedade têm do mundo. Só depois o “vemos”. Em um primeiro momento, o que cremos se sobrepõe ao experienciado. Depois, com as (com)vivências (trocas de experiências) e com o conhecimento (escolar/científicos) passamos a simbolizar/interpretar o mundo de forma mais consciente, responsável e alicerçada na(s) ciência(s).

O racismo vive mais no mundo intangível das concepções, nas formas de entender o mundo. As leis atacam preferencialmente as formas materiais desta (des)valorização de determinadas cores de pele. A educação formal tem que tratar do simbólico, das interpretações. Ensinar forma espíritos. A escola trabalha não só elementos da cognição, mas também da metacognição (capacidade de pensar o próprio pensamento).

Como vemos o que vemos: eis aí a chave para eliminarmos os preconceitos, notadamente o racismo.

A lei 9394 no seu artigo 26-A, no parágrafo 2º no diz: “Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras”. Percebamos que os conteúdos que seriam pelo senso comum exclusivos da disciplina de História, agora sob o ponto de vista de uma reconceituação do próprio ensino de História no contexto de uma exigência antirracista, é compartilhado com as disciplinas de Educação Artística e de Literatura. Ora, para reconfigurar (pre)conceitos, nada melhor do que a arte e a literatura. Estas (com)vivem no aspecto simbólico das sociedades. Portanto, não basta saber a História da África. Melhor para compreendê-la é cantá-la, desenhá-la, poetá-la e escrever sobre ela. Os estudantes, desta forma em sala de aula, poderão rever, repensar reconfigurar sua compreensão sobre o racismo (do outro e dele mesmo).

Para que seja possível uma recontextualização das (pré)concepções sobre os negros, é importante na literatura apresentar escritores e escritoras negras, como a filósofa Djamila Ribeiro ou escritores já conhecidos como Machado de Assis; sem esquecer nosso presidente Nilo Peçanha. A lembrança de Machado de Assis não precisa de justificação. Quanto a filósofa Djamila, ela é ativista do movimento negro e seus escritos são de fácil acesso, estão disponíveis nas redes sociais e no jornal Folha de São Paulo. Evidente que o viés adotado pelo professor, não pode ser no sentido de mostrar exemplos de casos raros, excepcionais. A intenção sempre é a expressão máxima do valor de todas as pessoas, cuja pele é o que menos importa. O professor deve incentivar uma cultura que saiba identificar a exclusão de toda a ideia, de todo o simbolismo que ratifique não só racismo, mas também a opressão em relação as mulheres e às minorias.

quinta-feira, 20 de novembro de 2025

Sou ou não um filósofo? (Texto bem antigo)

 

Estava num encontro de professores após uma breve fala com eles. No final, uma colega perguntou-me à queima roupa: Professor, o senhor é filósofo ou somente dá aulas? Fiquei sem resposta imediata. Preferi escrevê-la. Isso porque a pergunta deixou-me perplexo, pois é muito complexa. É maior do que eu posso responder.

 

Ao perguntar, a professora partiu do princípio a priori de que sei o que (quem) sou. Confesso que estou longe de saber definir-me. Passei a refletir sobre quem somos. A imagem que surgiu em minha mente foi a de um ramalhete de várias flores coloridas. Sei que estou sendo poético, mas não consigo evitar.

 

Eu acho que as pessoas são assim: buquês de flores. Quero dizer que ninguém é isso ou aquilo, somos um conjunto de “issos” e “aquilos”: como é um ramalhete de várias flores. Se separarmos todas as flores individualizando-as, excluímos a ideia de ramalhete (uma composição de flores) e falamos de cada flor (fragmentos do conjunto). Quero concluir que somos muitas coisas (composição) e se separarmos cada uma (individualização) morreremos, pois somos o conjunto e não os detalhes. Se algo é de nós retirado, perdemos nossa humanidade complexa.

 

Quando penso o que sou, vejo um conjunto infinito de contextos e relações. Não posso dizer que sou a flor do centro do ramalhete, ou a mais bonita, ou ainda a que está mais à esquerda. Sou todas as flores que me fazem.

 

A pergunta da professora sacudiu-me. Quero crer que ela via em mim uma faceta do conjunto do que sou. Ao questionar-me, obrigava-me a escolher alguma flor de mim e afirma-la como sendo o conjunto, o que sou. Para aclarar mais: caso eu afirmasse que sou filósofo, eu teria escolhido as flores da filosofia, ignorado as demais, e as escolhidas seriam apresentadas como um cartão de identificação. Porém, como posso escolher o que apresentar de mim para os outros? Se eu escolhesse um item do que sou, retiraria das demais pessoas a liberdade (e a responsabilidade) de escolherem quais flores de mim querem apreciar.

 

Afinal, sou ou não sou filósofo? Ora, como vou saber? Essa resposta não pertence a mim. Pertence a quem escolhe do meu complexo ramalhete, as flores que mais aprecia. Mesmo eu tendo todas as garantias institucionais que estudei Filosofia, quem vai confirmar se sou (ou não) filósofo é quem lê o que escrevo, quem ouve minha fala. É a minha história que decide. Melhor dizendo, são as pessoas que decidem quem eu sou na História. Insisto que se sou ou não filósofo, é uma pergunta cuja resposta não cabe a mim. Não tenho o poder de decretar se sou ou não.

 

Quem pode dizer de uma pessoa que ela é essa flor ou aquela, escolhendo no ramalhete as flores que mais chamou sua atenção? Dá para perceber a responsabilidade disso, escolher o que a pessoa é?

 

Após estas reflexões, vou deixar a professora que me questionou com a sua dúvida. Na verdade, vou dividir com ela a dúvida que também tenho.

 

 



                      Obesidade espiritual

 

Desde sempre teve aquela sensação estranha. Sentia que sua alma era maior que o corpo. Difícil explicar. É como quando alguém coloca uma blusa de tricô pequena. A blusa fica estranha, a malha fica esgarçada e pode-se ver a pele por baixo. Pois é, sentia algo assim. O corpo comprimia a sua alma. Ela ficava visível, vazava pelos olhos e pela fala.  

E o pior, o corpo crescia na velocidade X e a alma na velocidade 2X.  Queria diminuir a alma, mas essa missão, amputar o espírito, é impossível.  Tentava sonhar menos. Ler menos. Amar menos. Imaginar menos. Porém a vida não pode ser reprimida. O mundo é leitura. A beleza é inspiração. A mulher é para ser amada. Então, crescia por dentro. Um horror, um obeso espiritual. Então o corpo não aguentava, esgarçava-se e seu conteúdo intelectual vazava pelos olhos, pela boca e pelas mãos. Enfim, a malha corporal esticava até aparecer o que tinha dentro. Essa sensação era muito estranha para ele.

Queria esconder o fenômeno. Queria ser mediano. Sentar no fundo da sala de aula. Queria esquecer as palavras bonitas e dizer palavrões. Queria não admirar as moças delicadas, preterindo as desejáveis. Queria não fazer a diferença. Mas o que fazer? Todos o achavam estranho! Gostava mais de poesia do que de jogar bola.  Gostava mais de literatura do que do recreio. Apaixonou-se pela colega de óculos grossos, sem graça, mas super delicada. Amou a guria apesar dela nunca saber disso. Era fato: a alma dele estava saindo pelos poros e o colocando nessa situação difícil.

Tentou ser igual aos demais. Como todos tentou amar a guria mais bonita da sala de aula. Tentou bagunçar e colar na prova. Tentou vestir roupas da moda e falar gírias. Não deu. A sua alma era como fermento e crescia demais. Via o interior das pessoas, queria estudar e ser escritor.  Queria transar mais tarde.  Queria ler dicionário e escutar músicas do tempo da mãe dele.  Gostava do passado e sonhava com o futuro. Seu corpo era o presente, mas a alma vazava sempre para o ontem ou para o amanhã.

Riram dele. Bateram nele. Desamaram-no. Porém, o corpo ficava cada vez menor.  Um horror! Algo muito engraçado: uma alma vestindo um corpo vários números menor.  Um dia desistiu de ser igual aos outros.

A Academia Brasileira de Letras teve que mandar ampliar algumas salas para acomodar os que admiravam aquela alma. As editoras tiveram que contratar mais gente para dar conta daquele espírito que transbordava letras e rimas. Uma pessoa só não pode amar aquela alma enorme, não davam conta! Foi necessário milhares de almas apaixonarem-se por ele.

O moço está por aí ainda, cada vez mais obeso por dentro. Hoje ele está ensinando como engordar os anoréxicos espirituais! Entendeu que os espíritos magérrimos estão cada vez com corpos maiores.  Corpões fantásticos que ocupam muito espaço e são muito caros.  Um desperdício.  Alimentando as almas, sobrará mais espaço no planeta. Afinal, almas não ocupam lugar nem precisam de riquezas e do consumo.

Esse moço criou um problema. Para termos mais obesos intelectuais, será preciso uma super produção de alimentos para as almas! Pois é, esse produto (para as almas) está em falta.

sábado, 11 de outubro de 2025

A lição da bruxinha.

 



           Naquele dia, quando Marquinhos acorda, está sentindo-se diferente. A fome é mais fome que o normal. A sede também.  A vontade de brincar se multiplicou por dez. A desvontade de estudar está a mil! O desejo de comer doces e tudo que é gostoso é insuportável! Quer muito, muitíssimo brincar. Não quer escovar os dentes ou pentear-se. Deseja apenas correr, dar cambalhotas. Não consegue controlar-se! Uma força muito estranha o domina de lá de dentro do sua cabeça. 


Sem observar suas obrigações corre logo para a rua brincar.


           Sempre foi mal criado e mimado, mas nunca ficou sem cumprir regras por tanto tempo. Mas está feliz, irresponsavelmente feliz. Sabe que não vai dar certo tal procedimento.  Porém, como conter-se? É querer e fazer, sem limites.


No fim da manhã já não consegue mais pensar direito. Cada vez está mais difícil imaginar as consequências do que faz. Não dá mais para perceber com clareza o futuro. 


Sente-se um pouco bicho. Bicho não pensa. Quer só fazer coisas que não precisa pensar e que dão prazer.


No final do dia o corpo está todo arranhado e roxo. Brigou com vários amigos, a tapa! Perdeu a paciência com todo mundo. Está muito cansado. Não estudou, não tomou banho, não cumprimentou ninguém e está esquecendo os compromissos. Quando chega a noite, dorme pesado.


Acorda na madrugada. Uma energia absurda o faz agitar-se. Quer comer. Também quer passear, tomar água, lamber um sorvete, andar de bicicleta, brincar de pega-pega. 


Desce até a cozinha para abrir a geladeira. Então ouve um riso abafado.


Uma bruxinha muito bonitinha e sorridente está no escurinho da cozinha. Após o susto ele pergunta o que está acontecendo.


- Não percebeste nada, Marquinhos? - Ela questiona.

- Sim! Estou diferente, pareço mais forte e só faço o que quero, o que eu gosto.

- Estás gostando? - Ela ria ainda mais.

- Sim... Não... não sei. Tem algo estranho!

- Eu tirei a tua alma e deixei só o teu corpo... - diz a bruxinha.

- Como isso? Eu sou só o meu corpo agora?

- Sim! Tu querias fazer só o que gostas. Então tirei de ti o que tu tens de humano: a reflexão sobre a realidade. Não podes mais pensar sobre o que fazer nem sobre o futuro. És apenas um corpo agora sem reflexão, como um cachorrinho é. Então estás livre do pensamento, da reflexão e... dos compromissos! - A bruxinha sorria!


Antes que Marquinhos pudesse se refazer do susto, a bruxinha sumiu. 


Quais são as consequências de não ter alma? Seu corpo é tão bichinho como qualquer outro! Bichos só querem brincar e comer, não podem pensar no futuro. 


Marquinhos cada vez pensa menos e deseja mais. Brigou feio com todos os amigos. Só quer ganhar nas brincadeiras, não divide nada, quer sempre ser o primeiro.  Cada vez fica mais bravo. Sente-se forte e... irresponsável!


Só volta para casa quando a fome bate. A mãe xinga, o pai também.  Marquinhos logo esquece a bronca. Não percebe que a bruxinha ri o tempo todo ao ver o guri todo sujo, mal cheiroso e cheio de doces na boca.


Marquinhos está exausto. Só quer dormir. Até o passado já está esquecendo. Esquece quem é, pois o desejo de comer, brincar e dormir é mais forte do que pensar sobre si mesmo.


Até que a bruxinha ficou com pena. Caso ele fique mais tempo assim, ficará um bichinho para sempre. Para sempre será escravo dos desejos corporais. Também já está perdendo a graça ver o guri assim, tão feio, tão perdido e tão... animalzinho. Então ela pega um vidrinho de cristal do seu bolso e lá está a alma, a consciência do Marquinhos.


A alma do Marquinhos é altamente pensadora e super cuidadosa. Ela suplica com o olhar, lá de dentro do vidrinho, que a bruxinha a deixe voltar ao corpo do gurizinho tão levado. A alma está com medo. O corpo está forte e cada vez mais manda na cabeça do guri.


              A Bruxinha abre o vidrinho. A alma pula e como um raio, plof, atinge a cabeça do Marquinhos. O guri treme todo e volta a si.


A bruxinha ri alto e vai embora. 


Com a consciência de si restabelecida, a ficha cai! Marquinho entende a lição da bruxinha!


E tu? Entendeste?

Liberdade: entre tijolos, palavras e catedrais.


 

terça-feira, 30 de setembro de 2025

Ao mundo da (des)informação sugiro a Filosofia na escola. Versão artigo

 


                                                                       Prof. Amilcar Bernardi

 

Publiquei um vídeo no meu canal com este título. Um colega disse que gostou. Então me intimou a fazer um artigo. Demorou uns dias, acabei aceitando.

Assim como no vídeo, vou iniciar indicando o que quero dizer com esta expressão milenar: Filosofia. São tantas as definições que vou apenas caracterizar os aspectos que entendo como essenciais.

Vamos lá.

A filosofia é uma postura. Postura não natural, que vem pelo esforço e pelo hábito. Vem pela rotina de estudar tudo que é possível estudar. Alguém questionará: É obvio. Todos os saberes exigem estudo. Não só na Filosofia.  Estudar não é algo só da Filosofia! 

    Prossigo então.

 Vou aprimorar mais um pouco. A postura a que me refiro é a de quem está desconfiado (a desconfiança como método). Inclusive desconfiado do que estuda. A Filosofia é incomodativa. Quem não incomoda por ser curioso de tudo, é apenas um estudioso e só. A Filosofia é mais.  É a postura de quem vê algo pela primeira vez, mesmo que este algo seja visto diariamente. Como assim?

Exemplifico.

Quando Isaac Newton foi atingido por uma maçã na cabeça, ele viu mais do que uma fruta que inúmeras vezes já caiu na cabeça de alguém. Ele espantou-se mesmo sendo um fato rotineiro, corriqueiro. Agiu mentalmente como se fosse a primeira vez que uma maçã cai. E espantado, pensou que não podia ser algo tão banal assim as coisas caírem sempre para baixo. Pensou ainda: que coisas pesadas doíam mais na cabeça do que coisas leves. Espantava-se com o óbvio. Ele repensou o que parecia ser simples.

Daí então veio a complexa teoria da gravidade. Ele poderia apenas xingar a fruta e pronto. A postura de espanto fez toda a diferença. Quem não se espanta não filosofa. Só isso? Tem mais, pois precisamos apontar para a Filosofia e não para a Física do exemplo do Newton.

Percebamos que nossa consciência, nosso cérebro, nossa alma estão dentro do crâneo. Ora, só percebemos o que está fora de nós através dos sentidos (cinco janelas para o exterior). E estes estão ligados ao cérebro (ligado a nós, portanto) por longos fios (os neurônios). Pois bem, tudo que está fora de nós (do nosso corpo), recebemos por vias indiretas (pelos sentidos). E tudo que é abstrato como os conceitos, antes de existirem em nós, vieram por palavras “de fora”, ditas por outras pessoas. Então, como saber que tudo isso é verdadeiro, se estamos encarcerados dentro do corpo? 

Para ajudar nessa questão (filosófica), os gregos usavam o termo alethéia (desvelar). Com isso eles pensavam que a verdade precisava ser desvelada, que sempre ela estava submersa nos enganos, nas opiniões e nos erros. Por isso, o filósofo é aquele que desvela a realidade. Os filósofos desconfiam de tudo, perguntam por tudo, se aprofundam em tudo. Afinal, tudo está velado, pois fora de nós.

Agora podemos dizer que não basta o espanto (thaumádzen). É preciso também o desvelamento (alethéia).

As coisas diárias estão aí, jogadas. Mas o fato de estarem aí a olhos vistos, não fazem delas coisas conhecidas para o filosofar. É preciso tomar um susto com o habitual para depois explicar o óbvio. Como fez Newton com a maçã.

Concluo que a postura do filósofo, aprendida pelo hábito de desconfiar e pelo estudo, se baseia no espanto e no desvelamento. Acrescento que desvelar é conceituar o que foi desvelado, é argumentar, é provar que a reflexão sobre o objeto em estudo faz sentido para os envolvidos.

Lembrando que vivemos afogados no mundo da informação. Nós, solitários dentro da nossa cabeça, somos expostos às mais diversas novidades. Diariamente, a todo momento. Tudo sem profundidade, preso ao nível do não refletido. A partir do espanto com estas informações, buscamos desvelar seus segredos e passamos a outro nível: o nível do conhecimento. Desvelar o óbvio, avançar para o conhecimento, perguntar o que fazer com este conhecimento para qualificar a vida humana: esta é a postura filosófica. E quando esse processo termina? Nunca!

Pobrezinho do filósofo!

Ufa! Agora podemos ir para ensino da Filosofia na escola. Eu creio que nós professores não ensinamos a filosofia propriamente. É preciso algo a mais do que transferir o conhecimento filosófico.

O professor filosofa ao vivo na sala de aula.

Os estudantes vendo o exemplo, tenderão a fazer o mesmo. Ao filosofar a história da filosofia, os aprendizes tenderão a ter a mesma atitude. Claro, nem todos. Mas será que ensinamos na escola para que todos se tornem filósofos? Claro que não! O professor está ali para fazer com que os estudantes experimentem a atitude filosófica. Se conseguir que os estudantes tenham esta experiencia, já terá feito sua parte.

Nem sempre o professor de Filosofia é entendido no filosofar em sala de aula.

Ora, até Sócrates não foi entendido no seu tempo. Ainda bem que o professor não será condenado à morte como foi Sócrates. No máximo enfrentará um(a) coordenador(a) a questioná-lo. Ou ainda enfrentará alguns pais que não entenderão o processo do filosofar.

Mas, tudo bem, faz parte.

Para desapegar-se das obviedades do dia a dia, o filósofo em sala de aula tem suas ferramentas. Assim como o escultor, o pintor, o inventor e o escritor têm. Quais são? São cinco. Todas bem complexas. São duas perguntas ativas e três ações.

1)         O que é? (Conceituação)

2)         Por que é? (As razões, argumentos. Contextualizado na lógica)

3)         Socializar. (compartilhar o aprendizado na cooperação)

4)         Testar. (Junto com a comunidade aprendente, aplicar aos contextos sociais, políticos, econômicos e científicos. Aplica-se à realidade)

5)         O que se manteve válido até aqui, é base para novo desvelamento (alethéia).

Tu estás pensando que é muito complexo para os adolescentes? Concordo. Entretanto, ver o professor utilizando-se destas ferramentas, é fundamental para incentivar os estudantes. Eles vão utilizar estas ferramentas também. Alguns de forma simplória. Outros serão hábeis. Não importa. O que realmente é importante é que eles se admirem com tais ferramentas. Que eles percebam que é possível utilizá-las. Serão mais livres, pois após conhecê-las, poderão escolher continuar usando-as ou não.

Pior é aquele(a) que nunca terá a oportunidade de usar tais ferramentas!

Imaginemos nossos jovens tão pouco afeitos a leitura. Imaginemos quão inexperientes na arte da argumentação e da justificação racional. Não só os jovens, mas muitos adultos também. Pois bem, agora imaginemos novamente: nas salas de aulas (cooperativas aprendentes) todos eles se esforçando para se espantarem e desvelarem o mundo. E mais, testando suas capacidades argumentativas. Imaginemos estes aprendizes lendo alguns livros para melhorar sua postura intelectual frente ao mundo.

Então, ser professor de filosofia na escola é crer no imaginado neste último parágrafo. Não só crer, mas enfrentar a realidade diária dos estudantes. Realidade tão desfavorável à reflexão.

Que venha o(a) professor(a) filosofar em sala de aula! Sem a filosofia ficaremos dentro de nós, ilhados num mar de informações. Presos dentro de nós. Tão presos que acreditamos na mídia contemporânea que diz que não precisamos de ninguém, que nossa opinião vale mais que a opinião dos outros. Aos ilhados só resta a solidão de viver consigo mesmos, acreditando que estão em boa companhia!