domingo, 12 de maio de 2019

Contribuição ao artigo "Entre a esquerda e a direita" de Paulo Germano. Jornal Zero Hora


Caro Paulo Germano

Gostei da intenção do teu escrito intitulado “Entre a esquerda e a direita”.

Respeitosamente, gostaria de fazer alguns comentários.

Tu falas que a igualdade de salários, posses e riquezas leva à tirania.  Creio que não é possível estabelecer uma consequência lógica, linear e determinada tendo numa ponta a igualdade e noutra a tirania.  O conceito de tirania não é fácil, mas podemos salientar algumas ideias chaves. O tirano abusa do poder, oprime, domina, é ilegítimo e usa da força para controlar as pessoas. A tirania trás de um lado a ideia de poder e de outro a contraposição a este poder. Ora, a igualdade não trás em si mesma esta contraposição tão negativa. Caso um povo opte por ser igual entre si e eleja seu representante que tenha o mesmo desejo, não há motivos para a tirania.

Parece-me que trazes como evidente a concepção de que as pessoas não querem (naturalmente) ser socialmente iguais, portanto, se insurgiriam e, na sequência, o governante não aceitaria tal insurgência. Por não ser a priori um sujeito democrático, o governante certamente tornar-se-ia um tirano. Veja quantas concepções implícitas tu trazes:

1)        a igualdade é um mal social;
2)        as pessoas não querem a igualdade social;
3)        haveria insurgência;
4)        o governante necessariamente antidemocrático, retalharia não ouvindo o clamor popular;
5)        como consequência, teríamos a tirania implantada.

Ufa! É muita coisa implícita! Imagino que os povos indígenas da Amazônia, aqueles que ainda não conhecem nossa vida política (intocados ainda); estranhariam teu raciocínio. Afinal, acredito que tenham uma hierarquia mínima numa igualdade máxima possível.

Quero crer que a tirania não é consequência natural da igualdade, mas uma construção social que pode ser modificável a gosto das sociedades. Inclusive, podendo criar uma sociedade igual e democrática. É uma utopia, eu sei. Entretanto, modestamente entendo ser melhor esta utopia que a tua fatalidade lógica.

Mesmo nas sociedades democráticas (quando desiguais), não é possível sermos o que queremos ser, nem ter o que queremos ter. As pessoas são obrigadas a serem ou terem o que conseguirem! E, na grande maioria das vezes, conseguem bem pouco.

A igualdade proposta pelos pensadores da esquerda, não se refere a salário. Mas a oportunidades iguais. Mas não só isso. Uma formação intelectual em igualdade. Saúde em igualdade, bem como moradia e alimentação similar entre todos. O resto é consequência destas igualdades.


Quanto tu falas em competição, excluis a igualdade. Quem ganha já é um desigual em relação a quem perde. Eu lutava uma arte-marcial.  O instrutor ensinava: “Tu não vais competir com teu oponente. Tu vais competir contigo mesmo. A cada erro teu, uma aprendizagem. Só isso.  O oponente nunca será mais ou menos do que tu.” Entendo este ensinamento como um exemplo de uma igualdade real. Mesmo eu ganhando ou perdendo a luta, continuava igual em dignidade ao meu oponente. Entretanto, eu ficava melhor vencendo as minhas falhas. Só isso.

Quando a esquerda pensa em igualdade, no sentido que estou dando, não há esquerda ou direita. Apenas homens e mulheres  querendo se desenvolverem o mais que puderem como pessoas em sociedade. Não falemos, portanto, somente em igualdade de oportunidade. Mas de uma igualdade desde sempre. Ah! Igualdade não é tratar os diferentes como iguais. É tratar todos de forma que os diferentes tenham os mesmos direitos de acesso às benesses da sociedade


Escrevo na esperança de contribuir contigo.

Abraços fraternos

                                                Amilcar Bernardi
                             www.profamilcarbernardi.blogspot.com

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