quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Para quem não tempo para aprender

          Prof. Amilcar Bernardi

A palavra apreender* é um enigma para mim. Por mais que pense sobre o conceito, parece que sempre algo fica de fora. Apenas percebo que pessoas são X, entram em contato com coisas que não tinham consciência antes, então se tornam X+Y. É uma questão ontológica: eram algo, agora são algo mais alguma coisa. Não que sejam coisas somadas, mais parecem um suco onde muitas coisas se misturam e viram outra coisa, geralmente bem mais gostosa que as partes separadamente. Penso que a aprendizagem acontece quando fazemos suco intelectual das coisas que se apresentam aos sentidos. Puxa, não estou sendo nada científico, mas faz tempo que o ideal de cientificidade foi abandonado por mim. Gosto mais de sucos gostosos.

Na sala dos professores observo falas que afirmam: aos alunos do ano tal, falta base. Com certeza no ano anterior ou o colega não deu o conteúdo, ou o aluno não aprendeu. Pensando assim, criamos a mais pura lógica: se não aprendeu ontem, se hoje sem base ele não aprende, com certeza amanhã não aprenderá! Como eu não entendo muito de aprendizagem, questiono: qual o tempo para apreender isto ou aquilo? Sempre o ontem determina o que o aluno pode apreender hoje?

Na minha ignorância, penso que apreender não tem tempo passado ou futuro. Apreender é sempre para hoje. Não importa o ontem, o que importa é o que hoje o aluno sabe e o que agora ainda não sabe! Em relação a aprendizagem, o ontem serve apenas como a história do aprendente, que é útil para entendermos como devemos agir com ele hoje, sempre hoje. A ligação com os objetos, mesmo os abstratos, em relação ao apreender acontece nesse momento. Estamos plugados, on-line com a relação eu e o que pretendo incorporar à minha consciência. Mesmo quando aluno apreende a conjugar o verbo no futuro, a conjugação acontece agora!

Ora, se o aprendente não apreendeu algo ontem, o que importa? Hoje sempre é o tempo atualíssimo para ele saber o que ainda não sabe!

A “falta de base” do aluno é meramente a sua história. Ela apenas indica o que o educador deve fazer nesse momento: o aluno é sempre atual.  Desde que o ontem não signifique alguma lesão neurológica ou trauma psicológico impeditivo, é apenas história. A “falta de base” não justifica a não aprendizagem. Ela não impede nada, apenas insinua, inspira o educador a como agir agora, a como facilitar a incorporação sempre atual do que o aluno ainda não incorporou à sua consciência. As aprendizagens anteriores, só são “anteriores” na lógica inventada pelas pessoas, pois se houve aprendizagem ontem, ela ainda esta “aprendida” hoje. Sempre acontece agora! Se há esquecimento, não está disponível agora a aprendizagem de “ontem”, então não houve aprendizagem.

Apreender é um suco que está sendo feito e bebido a cada segundo. É um suco que não segue a lógica temporal. Apreender é algo que se faz e se consome sem que haja distância temporal entre o fazer e o consumir. 

* Faço a distinção entre aprender e apreender. Apreender significa apropriar-se de uma informação em sua complexidade. Após apreender não mais podemos esquecer.





Figura retirada do blog: http://cartasdepaulotarso.blogspot.com.br/2010/01/aprender-e-ensinar.html

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