sábado, 17 de dezembro de 2011

Concursos de beleza? (postado novamente)

Prof. Amilcar Bernardi


Os racionalistas como Descartes defendiam a impropriedade do corpo e exaltavam a razão. As coisas do espírito (racionalidade) não se confundiam com as coisas corporais. O corpo (os sentidos) se engana a todo momento, portanto, não é confiável. Inclusive prejudica a racionalidade, diziam. Lembrem (como exemplo) que foram os cálculos matemáticos e a inventividade do espírito humano que nos garantiram saber o tamanho verdadeiro da lua! O olho não foi capaz disso.
Pensavam os racionalistas que cultuar o corpo como fonte do conhecimento e da humanidade do homem é errado. O cultivo do espírito (razão) é o que faz do homem o que ele é, o que o diferencia dos animais.
Claro que essas afirmações já estão desgastadas pelo tempo. Hoje sabemos que espírito sem corpo é fantasma e corpo sem espírito é zumbi. Quero dizer que a racionalidade acontece através do corpo (dos sentidos) e que corpo sem racionalidade não é um ser humano.
Agora pergunto: Quando colocamos a beleza (do corpo) como um valor fundamental, o que acontece?
Todos os que participam dos concursos de beleza vão dizer que essa pergunta não faz sentido. Dirão que a pessoa não é bonita porque tem um corpo bonito e sim porque tem simpatia, fala bem, tem expressão corporal e cênica. Enfim, outros atributos (além dos físicos) fazem aquela pessoa bonita! Ficam inclusive ofendidos e nos chamam de ignorantes se falarmos que, mesmo assim, o que vale mesmo é o corpo. Os adeptos dos concursos de beleza quando advogam que a beleza da alma se confunde com a beleza da plástica corporal, tentam se defender antecipadamente. Defendem-se dos que dizem que tais concursos são principalmente exposição de corpos. A necessidade desta defesa é compreensível porque é muito difícil defender de forma clara uma vitrine de corpos humanos. Então é imperioso encontrar algo mais do que a exposição de pele, cabelos e ossos para podermos validar moralmente um concurso de beleza.
Quando a bela criança de seis anos, Natália Stangherlin, ganha duas vezes concursos internacionais de beleza, podemos dizer que estamos incentivando nela aquilo que a faz humana? Quero dizer, estaríamos dizendo a esta criança linda que o principal na vida não é a plástica? Ou estaríamos dizendo, no sentido do primeiro parágrafo, que o corpo sem espírito (racionalidade) deve ser cultuado? Melhor ainda: uma criança indefesa, aos seis anos, exposta aos flashes, ao glamour, às viagens internacionais, conseguirá internalizar valores outros que não somente os da beleza física? Quais valores estariam sendo fixados na alma dessa criança, antes que ela tenha condições de refletir sobre os próprios valores?
Claro que os defensores dirão ao ler o parágrafo anterior: convém entender que a beleza corporal dura pouco tempo. Que antes da reflexão madura é imperioso curtir a juventude e a graça de ser bela.
A pressa justificaria a irreflexão. Afinal, ficamos feios muito cedo.
Arrisco-me muito ao escrever a minha opinião. Serei duramente criticado.
Entendo que as crianças não sabem o que é o belo. É a gente que ensina. Também não sabem o que é o bem. A gente ensina. A criança é linda porque é pura. È linda porque é boa. A criança não é linda porque é bela na plástica corporal. O corpo é um detalhe pequeno se pensarmos a beleza de ser criança.
Cabe saber se aos seis anos salientar a beleza plástica é algo bom. Gostaria de manter essa dúvida em minha alma até que provem em contrário, ou seja, que deixar a criança exposta ao olhar público, ávido por belezas passageiras e desejosos de corpos magníficos, faz bem. Se faz bem para o desenvolvimento das meninas e meninos como um todo! Insisto: como um todo. O desenvolvimento de uma faceta só empobrece.

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