Prof. Amilcar Bernardi
Novamente vem o fim de semana. Ávido vou buscar o jornal e encontro nele a coluna do Bicca Larré. Ele não me conhece, porém sinto-me seu amigo. Gosto do que ele escreve. O assunto do meu amigo hoje é muito importante. Adoro esse tema e já escrevi algumas coisas sobre ele. Bicca Larré, meu amigo que me desconhece, falou do meu primeiro amor: as palavras.
Não lembro quando senti meu primeiro amor. Talvez lá na educação Infantil, quando eu era criança. Porém, lembro-me das sensações maravilhosas dos meus primeiros escritos. Lembro também que fui apresentado às letras poéticas através de um bloquinho da minha mãe, a Maria. Era um bloquinho pequeno, cor de vinho ou marrom (da capa mal me lembro). Minha mãe tinha nele alguns poemas copiados, outros que ela mesma fez quando era adolescente. Eu achei o máximo! Minha mãe escrevia coisas bonitas! Embaixo dos poemas que ela havia feito, havia as iniciais secretas dos seus amores de guria. Eram enigmas para mim. Quem seriam eles? A letra era muito bonita, trabalhada.
Lembro que queria escrever como ela e ter amores secretos também, amores que deixariam iniciais enigmáticas embaixo de cada poema meu. Como contou meu amigo Bicca Larré na sua crônica de hoje, tornei-me como ele um garimpeiro a buscar palavras bonitas e sonoras. Por isso, creio que meu primeiro amor foram as palavras, depois as gurias. Eu aprendi logo que todos um dia vão se apaixonar, alguns vão casar e serem felizes. Porém, poeta serão poucos, bem poucos. Amar é destino de todos. Escrever não. É escolha, é trabalho e amor ao belo. Escrever é garimpar palavras e encontrar filões de ouros verbais. Um poeta, um escritor é um ourives de palavras, delas saem joias preciosas.
Então, meu primeiro amor foram as palavras, graças à minha mãe. Com certeza meu último amor será o mesmo, pois sou fiel. Nunca consegui trair as palavras amando outra coisa. Nunca consegui pintar, tocar instrumentos musicais, cantar ou outra coisa qualquer. Escrever me seduz de tal forma que nada mais posso fazer. A magia do caderninho materno de poemas copiados e inventados fez de mim para sempre um garimpeiro/ourives de palavras.
Meu primeiro e meu último amor será o mesmo. Sou um homem fiel e constante. Sou um homem previsível. Casei com as palavras ainda criança e este amor será eterno enquanto minha vida durar. Espero um dia estar num caderninho de poemas nas mãos de alguma mãe delicada, para que outro casamento com as palavras possa ocorrer.