Fiquei
chocado. Eu nunca havia me deparado com essa avis rara: um genuíno terraplanista.
Nunca imaginaria que tal mentalidade medieval estivesse tão perto de mim.
Como descobri
que essa crença tão antiga estava naquela alma? Discutindo com ela Einstein?
Vida interplanetária? Ou falando sobre os conceitos futuristas da famosa série Jornada
nas estrelas? Não. Nada disso. Bem menos!
A descoberta foi
bem gradual. Não houve uma afirmação anticopernicana do tipo: Eureka!
(parafraseando Arquimedes) A terra é plana! Ele nem negou enfaticamente a
genialidade do grego Eratóstenes, nascido em 276 a.C., que conseguiu
medir a circunferência da terra. O cidadão terraplanista não bradou: Eratóstenes
era um imbecil! Não, nada disso. Foi menos assombroso, mas de qualquer
forma, chocante. Uma certeza que veio a “conta-gotas”.
Tudo começou
quando o cidadão, rindo (e duvidando) do Coronavirus (COVID - 19), afirmou: É
bobagem proibir o aperto de mão das pessoas e os abraços, pois pobre só pensa
em transa. Então, pura perda de tempo! – Concluiu.
Fiquei estupefato.
Era mais que uma piada ignorante e preconceituosa, era sintoma de uma ignorância
superlativa!
O tempo passa
e a coisa fica pior. Alega o cidadão que o nazismo é coisa de comunista, e que
todos os meios de comunicação, todos, mentem mancomunados com a esquerda
internacional.
A coisa ficou
feia quando este cidadão de bem, afirmou sabiamente, que a pandemia (se
referindo ao Coronavírus) era uma fake-news nacional. Observem a lógica: Se
morre mais gente por doenças infecciosas já instaladas aqui, como a dengue,
como pode o Coronavírus ser uma doença tão grave se morreu tão pouca gente
infectada? Disse ele.
Surtei
internamente! Então, se não cuidamos das doenças a ponto de torna-las
epidêmicas, vamos esperar que o Coronavírus se torne uma! Lógico! Enquanto não matar
centenas de milhares de pessoas, é apenas uma doencinha! É claro! É preciso deixar mais
gente morrer para ser perigosa. Aff!
Pois é, aí a minha
ficha caiu: o cara só podia crer que a terra é plana! E isso não demorou a se
confirmar.
Hoje o jovem
terraplanista e criacionista, elogiou a democracia brasileira. Ele disse: Nunca
imaginei como a liberdade política atual é bela. Por um momento acreditei que
ele tinha cura. Afinal, nada que bons livros não possam curar. Entretanto, ele
continua: Adorei ver as pessoas livremente se expressando, pedindo o
fechamento do congresso e do STF! Aí sim, a democracia será libertada dos
entraves destes inúteis!
Só para ter
certeza de tal deficiência intelectual, perguntei: E o AI-5? O lunático medieval, desmanchou-se em elogios.
Afinal, disse ele, alguém tem que mandar nesse povo, né. Afirmou ipsis verbs: Deixar todo mundo muito livre, sempre dá
muita merda.
A dúvida
acabou. O cara é mesmo um olavista, terraplanista e criacionista.
Hoje compartilhei
com este cidadão de bem um vídeo. Falava sobre o evidente problema constitucional
do Sr. Presidente ter incentivado o movimento do dia 15. Nele as pessoas
pregavam o fim do congresso e do STF. O intelectual salientava no vídeo que o representante
máximo do Executivo (talvez infectado) ao cumprimentar alguns manifestantes com
abraços e apertos de mãos, assumiu o risco de propagar o Coronavirus. Eu, ao
compartilhar o vídeo, salientei que o palestrante é um cientista político.
Salientei para enfatizar o peso dos argumentos.
O whatsApp registrou
o recebimento do vídeo (de 15 minutos aproximadamente). Em dez
segundos a criatura abominável, o demônio da tasmânia das ignorâncias,
responde: O cara só falou merda. Deve ser petista ou comunista... tanto faz.
Tive então a
certeza dolorosa. O sujeito vive num planeta plano. Negando a pandemia, mentalmente
está no tempo da revolta das vacinas (1904). Está vivendo no tempo da “democracia”
baseada no AI-5 e garantida pela inexistência do congresso e do STF.
Desisti,
bloquei, deletei e não brinco mais com ele. Mas antes, mandei a última e
enigmática mensagem para o sujeito: PORRA, A TERRA NÃO
É PLANA!
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