Imaginemos a seguinte situação. Em um quarto em nossa casa
há um recipiente de vidro com uma fragrância muito boa e muito forte. O poder
do seu conteúdo de exalar perfume é impressionante. Tu queres conter o perfume
que já tomou conta da casa. Entretanto, para conter a fragrância só possuis o
recurso de portas feitas de grades e de cercas de arame. É fácil imaginar o
problema que se impõe. Com grades e cercas é possível impedir o acesso ao
frasco e também impedir que ele saia do quarto, mas é totalmente impossível
confinar o perfume. Os meios são inúteis para a finalidade a que tu te propões.
Com grades e cercas prendemos o frasco, mas nunca o perfume. A casa vai
continuar perfumada. Os meios impedem os
fins.
O Estado inúmeras vezes está diante de problema similar. Ou
seja, pode prender corpos físicos, mas não as almas dos apenados. Estas
continuam livres, apesar dos seus invólucros corporais estarem sob a tutela
estatal. Nestes casos, o Estado pode pouco, muito pouco. Eis o limite das prisões: elas prendem corpos
apenas. Como exemplo, entre tantos
outros, temos Gandhi, Mandela e Martin Luther King. Prender corpos é o limite
estatal. Pobre Estado, medíocre Estado.
Na metáfora do primeiro parágrafo, quero dizer que se o
Estado quer impedir ideias com grades, torna-se uma instituição inútil enquanto
meio para tal fim. Há almas que são maiores que seus corpos. Encarcerar estes
não isola aquelas. Se uma pessoa é mais que seu invólucro corporal, se uma
pessoa se torna uma ideia, não serão grades os instrumentos adequados para
impedir a liberdade. Almas não podem ser presas.
Gradear o pote que contém o perfume, não impede a
fragrância. Da mesma forma prender alguém por questões políticas não impede
seus ideais de fluírem. Com certeza,
inúmeras vezes prender o continente volatiza ainda mais o conteúdo.
Pobre é o Estado e medíocre são seus agentes quando o corpo
aprisionado se recusa a sair da cela, quando o calabouço mais exalta seu
espírito e sua fala. Ridícula é a
situação de um judiciário quando mantém entre grades inúteis o que se exala
pelo ar. É vexatório quando a politização do judiciário cria a situação fática em
que manter na cela o corpo apenado, apenas aclara a própria incompetência
estatal.
Eis o limite indiscutível: ao mísero Estado resta apenas a
possibilidade de prender corpos nada podendo contra seus conteúdos, suas almas,
seus ideais.
Incrível é o caso em que o preso ao querer se manter na
cela, mais livre é.
Incrível é o caso em que ao querer manter o preso
encarcerado, encarcera a si mesmo o judiciário.
Quando a prisão é política, quando o medo é da voz e da
ideia as grades são inúteis.
É imperioso soltar o corpo injustamente preso, pois esta
alma sempre foi livre, nunca conheceu nem conhecerá limites físicos. Pobre
Estado, risível poder tão fraco que se limita apenas a prender corpos.
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