sábado, 12 de setembro de 2020

A política e a projeção narcísica.

 


 

É interessante perguntar o que nos chama atenção quando andamos por aí. Uma moça bonita passa e eu olho. Olho porque a beleza não está totalmente na pessoa, mas muito mais em mim que a identifiquei na moça que passava. Da mesma forma, quando rejeito o tema da conversa que ouço sem querer no transporte coletivo, a rejeição está em mim e não entre as pessoas que dialogam ao meu lado.

 

Até mesmo a linguagem corporal sofre este efeito: eu a decodifico em função do que está em mim.

 

 Percebo aquele cidadão como uma pessoa arrogante. Assim me informa a sua postura. Está empertigado, ereto e com o peito levemente arqueado para trás. Leio aquele corpo e rotulo a pessoa. Nem percebo que ela está indo a uma farmácia para comprar um remédio para dores nas costas. A dor, não percebida por mim (externa à minha consciência) e que retesa a musculatura do indivíduo, fez-me ler a postura como a de um sujeito arrogante. Projetei minha percepção sem sequer perceber que o fiz

 

Quando vejo naquele livro um título interessante e vou comprá-lo, nem percebo que o interesse (que faz o título ser “interessante”) é meu, é interior e derivado das minhas vivências sociais, escolhas e cultura. Pouco a ver com o livro (que nem li ainda).

 

E por falar em cultura, ela sou eu e também é “nós”. Entretanto de todas as experiências culturais das quais faço parte, algumas eu me incluo mais, outras menos, outras tantas apenas tenho conhecimento delas. Aproximo-me daquelas que mais me identifico.

 

Voltando a moça bonita do primeiro parágrafo. A beleza que eu depositei nela e que fez dela objeto da minha atenção, é oriunda dos meus desejos internos (a maioria inconscientes). Na medida de como me construí (dentro da dialética do “me construí” e “fui construído”) vou vê-la como apenas bonita ou até sexy.

 

Eu projeto para além de mim o que sou.

 

Poderíamos chamar este fenômeno de projeção. Este mecanismo ocorre quando percebo como existente “fora” o que está “dentro” de mim. Minhas representações internas encontram um hóspede na vida real.

 

A emoção, o desejo e o valor que estão em mim, passo a vê-los a minha frente. Geralmente, e é a regra, a projeção é um mecanismo de defesa. “Empurro” para o outro o que não quero ver em mim. Exemplo: o vendedor de carros usados que sempre parte do princípio que será enganado ao comprar estes veículos. É possível que a má-fé que ele vê no cliente esteja mais em si mesmo do que no outro.  Ou ainda aquele sujeito que vê corrupção em todo e qualquer ato político. Talvez a corrupção (ou o desejo de usufruir dela) esteja no rol dos seus desejos (que precisa negar). Perceba que no imaginário desta pessoa, quanto mais ela esbraveja contra a corrupção, mais ela imagina que está a salvo de ser corrupta (ou que percebam seu desejo de corrupção).

 

Outra justificativa para projetar meu interior para fora, é a projeção narcísica. É neste tipo de projeção que este artigo quer focar.

 

Vejo pessoas bonitas porque são parecidas comigo ou tem a aparência que eu queria ter. Apoio o modo de vida voltado para o consumismo, pois faço o mesmo ou queria poder fazê-lo. O mesmo ocorre com o trabalhador que apoia a redução dos direitos trabalhistas. Ele admira o empregador porque admira o modo de vida dele, e um dia sonha ser empresário também. O conceito da meritocracia cai bem neste último exemplo.

 

A projeção narcísica, ou seja, quando tenho simpatia pela outra pessoa porque ela é similar a mim, tem efeitos interessantes na política.

 

Aos narcisos na política, proponho as questões abaixo.

 

Por que admiro um corrupto? E admiro tanto a ponto de negar a evidência da sua corrupção.  Por que apoio tanto quem fala de morte e violência? O que acontece comigo quando brigo com meus familiares para continuar fiel a um sujeito racista? Por que defendo tanto quem eu mesmo não encontro argumentos viáveis para defender? Então brigo, ofendo, agrido por não ter o que dizer.  O que esta pessoa nefasta tem que faz com que eu sofra tanto e tantas amizades perca?

 

Uma boa hipótese é o mecanismo de projeção narcísica. Tudo o que esta pessoa tem de ruim eu admiro. Admiro porque eu sou assim ou por que eu quero ser assim. É por isto que ofender esta pessoa me ofende tanto.  Neste caso ou me educo para a política ou procuro terapia.

 

Caso a hipótese de projeção narcísica seja verdadeira para o meu proceder, a conclusão será obvia: ao ofender o sujeito, ofende a mim mesmo. Afinal, psicologicamente, estamos unidos pelos mesmos valores e aspirações.

 

Na medida em que a realidade mostra que aquele sujeito (que é meu ideal de conduta) se mostra um monstro, na mesma medida em que eu continuo a defende-lo mesmo assim, tanto mais a hipótese vai se tornando um diagnóstico perfeito.


sexta-feira, 11 de setembro de 2020

Lendas urbanas e delírios na política nacional

 


 

Vou começar meu texto comentando sobre lendas urbanas. Lá pelos últimos parágrafos o leitor entenderá o porquê disto. Peço paciência

 

As chamadas lendas urbanas têm algumas características que as definem. Elas transformam situações, que até poderiam acontecer de fato, em verdades sobrenaturais.  

 

Caso haja assassinatos reais no bairro tal, a lenda dirá que é por que um matador contumaz lá mora e escolhe malignamente suas vítimas. Notadamente aquelas que por lá passam em torno da meia noite. O fato é confirmado por alguém que ouviu o relato de alguém que viu, em algum dia de uma noite qualquer, o assassino fazendo mais uma vítima. E mais: quando ela morria, o relógio da catedral batia as doze badaladas da meia noite.  A comunidade sente o ar de mistério crescente. Questionam-se: por que o Padre não negou o fato? Quem cala consente!  

 

Do verossímil ao inverossímil foi um passo!

 

Para que a lenda se consolide, algumas questões não podem (nem devem) ser respondidas: Quem viu? Quem morreu? Quando foi? O Padre sabe destes acontecimentos? Há boletins de ocorrência que relatem tudo o que se diz?

 

As perguntas não podem ser feitas por que a lenda é isso: quase-crença, repetição, medo, quase-crença, repetição e medo.

 

Para que uma comunidade repercuta a lenda, um local é fixado para que o evento macabro ocorra. Então, muitos que lá passam acreditarão que viram (ou quase viram) algo. Outros dirão que ouviram (ou quase ouviram) o grito de horror. Já outros comentam que um parente antigo presenciou o fato ao passar por lá, mas conseguiu fugir. Detalhe importante: contou a história pouco antes de morrer, pois já era um idoso.

 

Como negar a “veracidade” de todos estes “fatos”? Tão fartamente relatados?

 

Todas as ambiguidades e incongruências são generosamente suprimidas por hipóteses fantásticas. Hipóteses que, já num contexto fantástico, se tornam aceitáveis.

 

Estas lendas tendem a confirmar preconceitos. Ocorrem em locais geralmente escuros (e pobres), abandonados (descuido da administração municipal), praticados por pessoas loucas, feias (geralmente homem) e belíssimas (se mulher – sedutora, bruxa, do mal). Lendas sempre envolvidas por aspectos religiosos (demoníaco, fantasmagórico, ritualístico, sobrenatural). Em função destas características, as lendas urbanas nunca são histórias com início determinado, meio e fim definitivo. Todos os contadores dela retiram algo e acrescentam outro tanto. Afinal, o que vale é o fantástico, o sobrenatural.

 

A lenda explica o inexplicável. Mantém o preconceito sobre determinados perfis de pessoas e dos lugares mitologizados.

 

Pretendo agora trazer para este texto a Profa. Marcia Tiburi. Farei somente um recorte sobre o que ela comenta sobre o delírio (Delírio do Poder, Editora Record, 2019). Após o comentário, vou ligar as características das lendas com as do delírio.

 

No livro Tiburi comenta que estamos em um delírio coletivo. Ela quer dizer que grande parte da sociedade brasileira está, sob o ponto de vista da política, confuso, deslocado da realidade.  Esta confusão aparece nos discursos que se afastam da realidade, que não respeitam os conceitos a que se referem. Exemplo: falam do comunismo sem saber do que falam. Exaltam a tortura sem refletir o que ela significou. Nesta linguagem distorcida tendem a resumir tudo em microconceitos deturpantes. Passam a viver numa realidade política paralela.

 

Eu acrescento que esta confusão distancia as pessoas do uso da razão (no sentido do seu uso crítico). Neste delírio coletivo, escolhem um líder que indique o caminho nesta confusão. A confusão é criada, mantida e desemboca num líder (também confuso!) que deve orientar as pessoas. A grade que prende a este mundo paranoico é a seguinte: se todos que me circundam pensam desta forma, não posso, não devo pensar diferente (estaria enlouquecendo).

 

O absurdo toma conta e o delírio vai se mantendo. Para cada atitude do líder absurdo, o discurso delírante se atualiza através de explicações mágicas. Exemplo: o líder diz que é a favor de matar pessoas. Entretanto, explicam/justificam os sujeitos do delírio: o líder quer matar, mas nunca matará de fato. É só um desejo, só isso.

 

As lendas urbanas e o delírio proposto pela Tiburi, tem vários pontos de encontro na nossa política nacional.

 

As lendas se baseiam no aspecto mágico, fantástico, tenebroso, ameaçador e se mantêm atualizadas por acréscimos míticos. Sempre alguém vai justificar seu medo acrescentando à história original um tanto do seu medo próprio. Desta forma, a lenda está sempre atualizada e atuante.  Neste aspecto, o delírio na política é muito similar a lenda urbana. Ele vive de ameaças aos que veem o mundo de forma diferente dele (no grupo). Cada delirante tem autorização prévia pra acrescentar ao delírio algo que o mantenha. Varia de um novo detalhe a uma nova ameaça.

 

Estas adaptações mantém a força ligante do delírio. Por mais que o líder faça algo que cause o mal, este mal será adaptado, justificado e incorporado ao discurso delirante como um bem.

 

Tanto a lenda urbana quanto o delírio na política, são evidentemente artificiais para quem possa vê-los de fora. Entretanto, para os que os vivenciam (estão dentro) é extremamente verdadeiro. Pergunta a quem acredita que viu a mulher de branco em frente ao cemitério, se não morreu de medo! A verdade da aparição foi tão verdadeira que quase teve um enfarto! Da mesma forma, pergunta ao sujeito delirante político se ele já brigou com alguém, quase a tapas, para defender seu líder.

 

A mulher de branco - no cemitério - e o líder - no palácio do Planalto -, são extremamente verdadeiros para quem neles crê.  Quem está de fora das lendas e dos delírios percebe as fantasias, mas está de fora e assim será mantido.

 

Aos delirantes e aos crentes em lendas, há duas possibilidades de cura.

 

- A realidade dos fatos batendo em suas portas mentais deixando a luz entrar. Exemplo: O terraplanista embarca numa nave espacial e percebe com seus olhos que a terra é plana;

 

- Ou o diálogo frequente, quase como se faz ao ir ao analista. Diálogo com os de fora da crença, que pela força reiterada dos argumentos, os farão acordar para a realidade (dos fatos). Este é o caminho mais difícil.

 

Os incrédulos do mundo dos fatos, crédulos do mundo fantástico das lendas e dos delírios, perguntarão:

 

A que fatos políticos te referes se tudo é discurso e interpretação? Deixo a dica: encontrarás os fatos somente se tu mesmo por eles procurares. Tu mesmo!

 

Vá tu mesmo fazer as compras e veja o custo crescente. Vá com teu amigo desempregado levar o currículo às empresas. Vá ao hospital particular procurar uma cura sem ter dinheiro. Lê tu mesmo os dados referentes às mortes pela pandemia. Procura, sempre pessoalmente, o que precisas saber. Podes perguntar onde e como saber o que queres saber, mas sempre saibas por ti mesmo.

 

A realidade vai se apresentar a ti quando tu mesmo a procurares. Deve te apresentar a ela!

 

Vai doer. Vai cansar. Vai desiludir. Principalmente desiludir.

 

Mas há vantagens em desiludir. O medo da mulher de branco em frente ao cemitério vai desaparecer de ti. Então poderás passar sem medo em frente ao campo-santo a hora que quiseres.  Caso consigas te desenvincilhar do delírio, ficarás livre do líder/messias. Sendo livre, pensarás por conta própria, terás opinião própria e poderás agir por si só.

 

Sair das lendas e dos delírios, não faz necessariamente ninguém mais (ou menos) feliz. Entretanto, com certeza, fará a pessoa mais responsável por suas ações na política.

 

Fica a dica.

 

 

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

A aceitação do (des)governo e o mecanismo de defesa.

 



     

Este texto fará um passeio pela psicanálise, psicologia e sociologia.  Um passeio despretensioso, como quem passa de trem observando a paisagem.  En passant.

           

Para subirmos os três degraus dos argumentos por mim idealizados até chegarmos à conclusão, vou começar falando o que é um mecanismo.

 

 O primeiro degrau. Por mecanismo podemos entender um conjunto de elementos que agem de forma harmônica para um fim. Se pensarmos num relógio mecânico, todo o seu maquinismo age de maneira harmônica para um fim: registrar, marcar a hora corretamente. Só podemos falar em harmonia tendo como parâmetro a finalidade do mecanismo.

           

Podemos imaginar, por semelhança com a definição anterior, um mecanismo psicológico inconsciente que age para nos defender. As vezes de eventos externos (da realidade), outras vezes de internos (da nossa psique).  Este mecanismo age protegendo nosso Ego (inúmeras vezes nos protegendo de nós mesmos).

     

Quer um exemplo pueril? Uma criança que vê seu bichinho de estimação morto e logo vai dizendo que ele está dormindo. Apesar dos sinais evidentes de morte. O mecanismo que ela usa (ou ela é usada pelo mecanismo) é a negação (da morte do seu objeto de amor). Quanto maior a negação, maior o amor da criança pelo animalzinho.

           

O princípio: quanto mais importante for o que está em nós, maior a ativação da negação para sua proteção (que pode ser por ocultamento).

           

O segundo degrau.  A desfiguração da realidade pode ser um sintoma da ativação de um mecanismo: a negação como mecanismo de defesa.

     

Nego/oculto para defender algo de extremo valor que está em mim. Valor positivo (um amor por exemplo) ou socialmente execrável (um abuso sexual por exemplo). Percebamos que se aceitamos o valor social que execra algo, este valor se internaliza e vai causar dor se eu fizer/sofrer este “algo”. Então, nego para mim mesmo (e por consequência para os outros) esta ocorrência.

           

Caso eu tenha internalizado duas coisas antagônicas, é excepcionalmente doloroso. Observemos a seguinte situação como exemplo.

 

Sou racista e também sei/internalizei que o racismo é execrável. Uma saída para não adoecer é defender um candidato racista. De que maneira?  Salientando nele apenas as outras características (que não o racismo). Desta forma se torna possível eu defender o racismo na prática (se eleito o candidato) e ainda garantir um discurso antirracista para mim. É só negar a realidade preconceituosa do candidato. Afinal, quem agirá como um racista é o outro, não eu. Nego (para mim e para os outros) que o candidato seja contra negros, assim como nego que votei nele por saber como ele de fato é. A negação me salva de ter que assumir (para mim e para os outros) quem eu sou e o que fiz. Como bônus, garanto – ao negar – que não vou precisar mudar internamente. 

           

O mecanismo de defesa protege meu Ego de se dissolver, de amalucar. Para ter sucesso, este mecanismo é inconsciente.

     

Caso seja algo consciente, é uma artimanha ou mau-caratismo (foge ao foco do texto).

           

Entretanto, todo o mecanismo para agir e se manter agindo precisa de energia. Então, fácil imaginar que manter a negação causa desconforto, mal-estar, estresse e angústia. Quanto mais a realidade exige do sujeito que a perceba tal qual é, tanto mais energia psíquica será exigida para manter a negação. A dor de negar (e manter a negação) deve ser menor que a dor de perceber a realidade e ter que internamente mudar.

     

Não é prazeroso nem provoca paz interna negar.

           

Terceiro degrau. Por que as pessoas negam a realidade do (des)governo atual? Por que negam o caráter esquizofrênico do presidente com suas confusões mentais e seus delírios persecutórios?

 

           A resposta pode ser uma espécie de mecanismo de defesa grupal. E por ser grupal, cada um fortalece a negação do outro.

     

Evito a palavra classe social, pois mesmo elas são mantidas pelas associações entre grupos.

           

Será possível o(a) cidadão(ã) cristão(ã), democrático(a) e altamente civilizado(a) dizer claramente que é racista, escravocrata, defensor da meritocracia que decide quem vai ser miserável? Talvez para alguns sim. Há grupos nazistas por aí. Mas, creio que a maioria se sente melhor negando sua inumanidade interior. Negam a vontade de morte demonstrada pelas falas do presidente para poder negar a sua própria. Negam que a terra é um globo e que a pandemia mata, para poderem esconder que se sentem seguros em suas casas e escritórios. Escondem que se alguém morrer, não serão eles (crença falsa. Falsidade também negada!). Quem morre é sempre o outro; é o credo destes.

           

Negar tudo isso é existencialmente caríssimo. Além de pagarem o “mico” de afirmarem a terra plana, que o comunismo é um ente real diabólico, que a universidade é subversiva e seguirem o astrólogo Olavo de Carvalho, ainda correm o risco de, ao negarem a pandemia, adoecerem ou verem algum ente querido se contaminar.

     

E por que não desativam o mecanismo de defesa?

           

Porque o custo é alto demais. Seria o cristão dizer que quer a morte de outro cristão (que pensa diferente ou que cometeu um crime). Seria como o hétero vigoroso aceitar que tem atrações estranhas por outros cidadãos de bem. Seria como o lojista cidadão de bem aceitar que prefere a morte dos clientes pelo vírus fatal, que fechar a sua loja. Como o dono de uma escola infantil que quer abrir suas portas, poderá aceitar em si mesmo que não se importa com a saúde das crianças?     

 

Nega sem poder fazer diferente, pois teria que aceitar que é uma criatura egoísta e desumana.

 

E tem mais: sendo eu parte de um grupo negante, reconhecer o que eu escondo é reconhecer que os outros também escondem algo. Quebraria o pacto de ouro do silêncio sobre o que o grupo é de fato. Afastaria-me do grupo e o grupo se afastaria de mim.

           

O famoso “pobre de direita” teria que aceitar o fato simples: que é pobre, dependente, subserviente e dispensável no mercado de pessoas que precisam de trabalho. Seu narcisismo sofreria golpe terrível desorganizando sua psique.

           

A classe média nega as maldades governamentais por que ela, caso não negasse, teria que aceitar que este (des)governo realmente a representa. Representa o que há de ruim nela. Portanto, o que não quer ver/saber de si mesma.

           

A classe média nada mais é que o muro ideológico que separa os miseráveis dos ricos. A classe média é pobre. Mas é feliz em negar isto olhando para os miseráveis como sujeitos de menos valia.

           

O que o grupo mais nega é o que mais ele é. Se nega que o corrupto é corrupto, é por que tem apreço pelo enriquecimento fácil.  Se nega que alguém disse que estupraria uma mulher mesmo quando a afirmação está em vídeo, é por que aceita tal coisa. Mas, em todos os casos, não pode se conscientizar que a corrupção e o estupro estão dentro de si mesmo.

           

Não tem força para sustentar as mudanças que a aceitação da realidade o forçaria a realizar. Desnudar-se dói demais. O mecanismo de defesa então deixa o outro sofrer, cegando-me para o fato que sou eu que o deixo sofrer.

           

Creio que assim fica mais fácil entender a quantidade enorme de pessoas que defendem o “coiso”.

           

Para não desacreditar na humanidade, prefiro pensar que adoecemos do espírito. Talvez a nova eleição seja a catarse que nos cure de nós mesmos, dos nossos demônios internos.

           

Assim espero.

           

     

Quêm lê muito não faz nada. Verdade?