segunda-feira, 16 de março de 2020

PORRA, A TERRA NÃO É PLANA!





Fiquei chocado. Eu nunca havia me deparado com essa avis rara: um genuíno terraplanista. Nunca imaginaria que tal mentalidade medieval estivesse tão perto de mim.

Como descobri que essa crença tão antiga estava naquela alma? Discutindo com ela Einstein? Vida interplanetária? Ou falando sobre os conceitos futuristas da famosa série Jornada nas estrelas? Não. Nada disso. Bem menos!

A descoberta foi bem gradual. Não houve uma afirmação anticopernicana do tipo: Eureka! (parafraseando Arquimedes) A terra é plana! Ele nem negou enfaticamente a genialidade do grego Eratóstenes, nascido em 276 a.C., que conseguiu medir a circunferência da terra. O cidadão terraplanista não bradou: Eratóstenes era um imbecil! Não, nada disso. Foi menos assombroso, mas de qualquer forma, chocante. Uma certeza que veio a “conta-gotas”.

Tudo começou quando o cidadão, rindo (e duvidando) do Coronavirus (COVID - 19), afirmou: É bobagem proibir o aperto de mão das pessoas e os abraços, pois pobre só pensa em transa. Então, pura perda de tempo! – Concluiu.

Fiquei estupefato. Era mais que uma piada ignorante e preconceituosa, era sintoma de uma ignorância superlativa!

O tempo passa e a coisa fica pior. Alega o cidadão que o nazismo é coisa de comunista, e que todos os meios de comunicação, todos, mentem mancomunados com a esquerda internacional.

A coisa ficou feia quando este cidadão de bem, afirmou sabiamente, que a pandemia (se referindo ao Coronavírus) era uma fake-news nacional. Observem a lógica: Se morre mais gente por doenças infecciosas já instaladas aqui, como a dengue, como pode o Coronavírus ser uma doença tão grave se morreu tão pouca gente infectada? Disse ele.

Surtei internamente! Então, se não cuidamos das doenças a ponto de torna-las epidêmicas, vamos esperar que o Coronavírus se torne uma! Lógico! Enquanto não matar centenas de milhares de pessoas, é apenas uma doencinha! É claro! É preciso deixar mais gente morrer para ser perigosa. Aff!

Pois é, aí a minha ficha caiu: o cara só podia crer que a terra é plana! E isso não demorou a se confirmar.

Hoje o jovem terraplanista e criacionista, elogiou a democracia brasileira. Ele disse: Nunca imaginei como a liberdade política atual é bela. Por um momento acreditei que ele tinha cura. Afinal, nada que bons livros não possam curar. Entretanto, ele continua: Adorei ver as pessoas livremente se expressando, pedindo o fechamento do congresso e do STF! Aí sim, a democracia será libertada dos entraves destes inúteis!

Só para ter certeza de tal deficiência intelectual, perguntei: E o AI-5?  O lunático medieval, desmanchou-se em elogios. Afinal, disse ele, alguém tem que mandar nesse povo, né. Afirmou ipsis verbs:  Deixar todo mundo muito livre, sempre dá muita merda.

A dúvida acabou. O cara é mesmo um olavista, terraplanista e criacionista.

Hoje compartilhei com este cidadão de bem um vídeo. Falava sobre o evidente problema constitucional do Sr. Presidente ter incentivado o movimento do dia 15. Nele as pessoas pregavam o fim do congresso e do STF. O intelectual salientava no vídeo que o representante máximo do Executivo (talvez infectado) ao cumprimentar alguns manifestantes com abraços e apertos de mãos, assumiu o risco de propagar o Coronavirus. Eu, ao compartilhar o vídeo, salientei que o palestrante é um cientista político. Salientei para enfatizar o peso dos argumentos.

O whatsApp registrou o recebimento do vídeo (de 15 minutos aproximadamente). Em dez segundos a criatura abominável, o demônio da tasmânia das ignorâncias, responde: O cara só falou merda. Deve ser petista ou comunista... tanto faz.

Tive então a certeza dolorosa. O sujeito vive num planeta plano. Negando a pandemia, mentalmente está no tempo da revolta das vacinas (1904). Está vivendo no tempo da “democracia” baseada no AI-5 e garantida pela inexistência do congresso e do STF.

Desisti, bloquei, deletei e não brinco mais com ele. Mas antes, mandei a última e enigmática mensagem para o sujeito: PORRA, A TERRA NÃO É PLANA!



Quêm lê muito não faz nada. Verdade?