quinta-feira, 28 de junho de 2018

Marx e as mutações virtuais.








Marx nos disse num dos livros do O Capital, que o homem, ao atuar sobre a natureza, ao modificá-la, ele modifica a si mesmo. Esta afirmação ficou buzinando na minha cabeça, como um mantra. No século XXI, ela tem novo sentido:  ao inventarmos tecnologicamente uma nova natureza (o espaço virtual), reinventamos a nós mesmos.

Sabemos que nosso século é o tempo em que trabalhamos sobre (e com) a informação. Ela, a informação, está personificada no mundo virtual, o ciberespaço. E quanto mais fuçamos no virtual, mais o virtual fuça em nós.  Estarmos interligados e sermos interligados, muda nosso modo de existir no mundo físico. Muda-nos culturalmente e ontologicamente.  Quanto mais vivemos, ou sobrevivemos, em rede, mais nos diferenciamos do que éramos há décadas atrás. Cedemos às investidas do mundo on-line.

Cada indivíduo relaciona-se com o mundo virtual das informações, como se ele existente fisicamente. Nesse lugar fictício buscamos coisas preenchendo-nos com elas. Aventuramo-nos pessoalmente (individualmente) na cornucópia virtual. E lá (não sei onde fica esse “lá”) encontro tudo o que quero.

Minha fé religiosa no espaço virtual onisciente e onipresente, faz com que eu creia na infalibilidade on-line da internet (pois ela está sempre em algum lugar onde algo acontece). Essa verdade virtual sempre presente aos acontecimentos, mexe comigo.

O espaço internético é um ser gigantesco que nos devora por osmose. É um deus fictício e real que nos faz, que nos constrói. Ele não pede licença para isso.

A realidade on-line tem vida própria. Se eu não me conectar diariamente, eu desapareço.  Se eu indivíduo morrer amanhã, não farei falta nos espaços virtuais. Eles independem de mim. Eu nada sou individualmente na rede.

Eu sou porque estou na rede (se fico off-line, esvaneço-me para o mundo, pois inconectável).

Sem a humanidade a rede nada é. Porém, a rede sem indivíduos continua sendo.  A inteligência virtual só precisa de mim para que eu reproduza seu poder. E quanto mais eu inserir-me na rede, mais poderoso eu serei porque estou conectado.  Simbiose. Quem é o parasita? Quem é o hospedeiro?

Eu, neste momento, já sei que vou por na rede este texto, pois só assim ele existirá independentemente de mim. Afinal, eu como individuo, não faço falta para a rede. Então, mesmo quando eu morrer, o texto permanecerá para sempre nos espaços virtuais (que nem perceberão minha desconecção por morte). Através deste texto, continuarei vivo na rede (mesmo sem corpo). No século XXI a imortalidade está fora de nós, fora dos corpos, dos livros físicos e dos espaços tridimensionais. Hoje a imortalidade é virtual.

Por que criamos o ciberespaço, nós nos recriamos e nos imortalizamos.  Estamos nos adaptando. Mas a cada adaptação, a tecnologia avança. Nos readaptamos novamente. Estamos nos tornando cada vez mais virtuais e menos corporais. O que não significa que nos tornamos mais espirituais.

Que venha o tempo. Só ele nos dirá até onde essas mutações nos levarão.

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