quarta-feira, 2 de setembro de 2020
domingo, 30 de agosto de 2020
A humildade e a arrogância.
Tive uma experiência interessante com um usuário da rede
social. Entramos em um brevíssimo diálogo sobre um tema de viés filosófico. A expressão “brevíssimo” é um fato. Meu interlocutor
não suportou argumentar além de breves linhas. Encerrou a discussão afirmando
que eu estava confuso sem ter as condições de sair da minha própria confusão. O que me chamou a atenção foi a arrogância.
Ficou claro nas falas que ele acreditava que sabia e que sabia muito. Sabia
tanto que decidiu em sua soberba que não valia a pena me ensinar seu saber.
Não precisamos ir ao Instituto Butantan (principal produtor
de imunobiológicos do Brasil) para sabermos que o antídoto para a arrogância é
a humildade.
Primeiro vou comentar o que a humildade não é. Ela não é
fragilidade ou covardia. Muito menos é submissão a alguma autoridade. Se acalmo
minha volúpia por dizer o que acho que sei, não significa que abster-me-ei de
dizer o que penso num tempo mais adequado. Quando abrando meu vocabulário para
não ser agressivo, quando não saliento meus saberes como se medalhas fossem, ou
ainda, quando não trago à luz do diálogo minha autoridade sobre o tema, estou
sendo apenas civilizado e cortês.
Agora passo ao que ela é. A humildade é uma virtude cortês.
É uma virtude por que é eticamente desejável e é cortês por ser uma atitude
polida. A humildade tende a não ofender ninguém. Ela é irmã da virtude da prudência. Assim
como a arrogância é irmã do desconhecimento de si mesmo. A arrogância é arrogar,
exigir para si uma preponderância sobre o outro. Arrogar para si sem saber se o
outro aceita esta arrogância. Quanta insensatez!
A arrogância é uma armadilha para os incautos. Ao olhar
para si mesmo não vê os perigos do caminho. Reconhecer nossos limites e estar
atento as qualidades da outra pessoa, é no mínimo, uma atitude que denota
inteligência.
A humildade é uma virtude adquirida no convívio com as
pessoas. Toda a cultura tem suas histórias sobre os arrogantes que se deram mal
na convivência social. O arrogante sofre muito. Sofre por que quer estar numa
altitude que não é real. Acredita estar numa montanha e os mortais lá em baixo.
Mesmo se Pedro em relação ao aspecto “X” tivesse uma tremenda
relevância, no aspecto “Y” poderia nada ser. E isto ao mesmo tempo! Exemplifico:
o proprietário do carro de luxo precisa
consertar a porta do veículo que, por defeito, não abre remotamente. Apesar de
todas as suas posses e delírios de poder, está totalmente dependente de outra
pessoa para realizar o conserto. No aspecto “Y” é apenas mais um cliente com
uma porta defeituosa.
O mundo é dialético! Para tudo que somos, outro tanto não
somos. Para tudo que sabemos, outro tanto nada sabemos.
Arrogar para si relevância, sem se importar com a pessoa
que será sobrecarregada com esta soberba, é quase uma psicose! A relação do arrogante
com o mundo exterior a si mesmo está falseada!
A humildade é uma força de caráter que é desenvolvida na
formação das pessoas, da infância até a morte. É uma virtude que deve ser
ensinada. Não só ensinada como um saber, mas entendida como uma qualidade que
deve sofrer manutenção diária. A humildade é uma decisão e um hábito saudável.
A humildade é uma inteligência emocional que só traz vantagens. É uma força
enorme, colossal, que remove montanhas. É uma força que não agride o
interlocutor nem diminui quem se expressa.
A humildade não é uma questão de religião, seita ou
moralidade. É uma questão de civilidade, de reconhecimento da dignidade da
pessoa humana. E, insisto, é uma questão de prudência.
Vou cair no chavão socrático: “Sei (certeza) que nada sei
(incerteza)” – o acréscimo nos parênteses é por minha conta.
O humilde tem certeza que há incertezas. Então, não pode arrogar
vaidosamente para si a arrogância. Ela não é permitida e é perigosa.
Arrogar para si é um ato grosseiro, petulante e uma aposta que somos algo ou
sabemos algo que nos afasta do sujeito que dialoga conosco. Quanta insensatez
grosseira e quanta grosseria civilizatória!
Sejamos humildes.
sábado, 29 de agosto de 2020
Elite: alguns egocêntricos se unem por algum tempo. Por algum tempo!
Um bando de egoístas juntos tem conseguido, sem
transcender ao egoísmo, fundar corporações religiosas e outras mais
voltadas à exploração pura e simples da fé do outro e de sua capacidade para o
trabalho e a entrega. (Marcia Tilburi.
Delírio do poder) – Grifo meu
Se vamos usar como mote a expressão egocentrismo, é
necessário primeiro reparar no seu conceito e nuances.
Uma boa perspectiva para compreender o egocentrismo é
partir da convicção de que o egocêntrico vive uma ilusão: a de que ele é ou
merecer ser o centro das atenções. Em uma criança de dois até, talvez, seis
anos é aceitável. É uma questão biológica, maturacional do cérebro humano. Até
que organicamente chega o momento em que a psiquê percebe que não é o centro de
muitas coisas. No máximo e por algum tempo, da sua família. Logo percebe que é
apenas mais um humano entre outros tantos.
Caso o sujeito permaneça focado em si mesmo e deste ponto
trace as referências para submeter o mundo a ele mesmo, radicalizará sua
dificuldade em se colocar no lugar do outro. A vivência com outras pessoas deve
forçar este desfoque de si. Não ocorrendo, a visão de mundo deste sujeito egocentrado
sofrerá sérias anomalias.
As pessoas que não conseguem pensar o social saindo de si
mesmas, que não conseguem se pôr no contexto de ser uma pessoa igual a tantas
outras, permitem a si mesmas defender o racismo, a morte de alguém (mesmo que
considerado bandido) e a competição social pela sobrevivência.
Somente sujeitos que se acham de alguma forma especiais, e
especialmente merecedores das benesses sociais, conseguem defender o
capitalismo neoliberal, onde o capital é reservado para alguns. E, claramente,
o defensor destes itens relacionados, se considera parte destes “alguns”. Nunca
se sente uma pessoa comum. Ele credita ser merecedor das
benesses do capital.
Os demais, caso não tenham algum privilégio é por que não são merecedores. Simples assim.
Os demais, caso não tenham algum privilégio é por que não são merecedores. Simples assim.
Estes “alguns” sempre tentam se sobressair, mesmo entre
eles mesmos. Percebem-se como merecedores natos de serem tratados como melhores.
Uma espécie de atavismo seletivo. Entretanto, sofrem de uma maldição egocêntrica: mesmo filiados a um grupo que represente seus
interesses, querem sempre ser os especiais entre os especiais.
Daí sentem muita inveja, são melindrosos (e agressivos),
arrogantes e espetaculosos. Espetaculosos por que exaltam seus atributos,
posses, amizades ilustres e sua riqueza (verdadeira ou imaginária- lembremos a
figura caricata do “pobre de direita”).
A inserção do indivíduo egocêntrico na plêiade de amigos
egocentrados sempre é difícil e, provavelmente, impossível em plenitude. São
egocêntricos entre egocêntricos: repelem-se mutuamente. São como imãs que
deveriam se ligar, mas cada sujeito é polo igual aos demais sujeitos. E polos
iguais se repelem.
São da extrema direita por que se acham extremos. Ou seja,
se percebem como diferentes das demais pessoas. Mesmo entre seus iguais
ideológicos, continuam se sentindo mais merecedores que os outros. Como todos se
medem por seus egocentrismos, o jogo de permanecer no grupo é duro, muito duro.
Percebam que se todos se sentem merecedores do máximo de
benesses, não haverá máximas benesses suficientes para todos. Haverá uma
disputa eterna, um jogo excludente sempre em execução. Que nome poderíamos dar
a este jogo? Quem pode mais, chora menos.
É a lógica da meritocracia entre aqueles que acreditam
terem mais méritos que os demais.
E por que se mantém juntos? Ora, primeiro por que seus
interesses são similares. Associados tudo fica mais fácil, afinal, sabem que
são minoria no contexto social brasileiro. Não que serem minoria seja um
problema para estes egocêntricos. Ao contrário: o desejo de serem únicos e
especiais os fazem orgulhos de serem poucos. Em segundo lugar por que sem os outros
egocêntricos, não haveria com quem demonstrarem suas qualidades especiais.
Seria como jogar o jogo de ser melhor que o outro, sem ter oponentes
para ratificar a excepcionalidade do vencedor.
O problema fundamental não se resolve: Como cada
egocêntrico vê o mundo através de suas próprias aspirações e desejos, não há
mundo suficiente para o grupo destes indivíduos.
Quero dizer, parafraseando a Professora Tilburi, que os
egocêntricos se unem e até cooperam entre si. Mas, nenhum abre mão de ser mais
e fazer os outros serem menos. Por isto esta reunião é uma reunião paranoica.
Sentam-se uns ao lado dos outros. Sempre próximos e visíveis entre si não por
que se sintam iguais, mas por que temem serem enganados uns pelos outros. Cada
um é um enganador e possível enganado.
Nada estranhável: é um grupo de sujeitos em que cada um se
percebe como mais inteligente que o outro, mais astuto e mais perigoso que seus
companheiros.
Até na periculosidade vale a meritocracia: que vença o mais
perigoso.
Não há fraternidade ou simpatia neste grupo. Há interesses
a serem defendidos. Convivem, toleram-se. Ritualizados se cumprimentam e
sorriem. Nos bolsos gravadores de voz. Nos celulares as provas dos conluios.
Cada um é o centro de tudo e tudo é centralizado nos interesses individuais.
Portanto, egocêntricos também se reúnem e colaboram entre
si. Mas de maneira paranoica.
Vemos esta realidade não só nas altas esferas do governo
Federal. Também percebemos o mesmo comportamento nos seguidores e apoiadores destes
poderosos da extrema-direita.
Todos se ajudam e se apoiam. Cada um acreditando que está
apoiando e ajudando a si mesmo.
Falo de fatos. Basta acompanharmos as peripécias do presidente, dos
ministros de governo e seus apoiadores no Congresso. E caso o leitor conheça
grupos de “amigos” da extrema-direita que acreditam fazer parte de uma elite, perceberá as mesmas característica aqui
descritas.
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